Téo Benjamin: considerações sobre o adversário (Botafogo)

10/11/2019, 15:13

Nesta análise, anterior ao clássico no Engenhão, um retrato de um Botafogo que tem ainda muitas dificuldades pela frente para serem resolvidas

O Botafogo derreteu no Brasileiro. Depois de terminar o primeiro turno na décima posição, com 27 pontos, o time somou apenas seis pontos no segundo turno e corre sério risco de queda.

Barroca saiu, Valentim chegou, e nada melhorou. O que aconteceu, afinal?

O forte do Botafogo nunca foi a intensidade. É o 17˚ do campeonato em desarmes certos, 18˚ em interceptações e o time que menos comete faltas (apesar de ser o segundo que mais sofre).

Em geral, o time é pouco combativo quando não tem a bola. Ocupa o espaço, mas não faz pressão. Isso ficou muito claro no gol de Maicon, do Grêmio, que abriu a goleada por 3×0 há dez dias.

O Botafogo ataca pela direita em boa situação. Tem dois-contra-dois pelo lado e Diego Souza arrastando Kannemann para fora da área, deixando dois jogadores no mano-a-mano lá dentro.

Basta encontrar o cruzamento…

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Não foi um caso isolado. Enquanto o adversário avança, o Botafogo anda para trás, recua e dá espaço. Não fecha o passe, não agride, não desarma. Basta assistir os melhores momentos contra o Santos ou qualquer outro jogo para ter a mesma constatação.

Repare no segundo gol, de Marinho. Há nove botafoguenses (mais o goleiro) perto da própria área, mas o atacante faz o que quer.

Vamos comparar o 10 últimos jogos do Botafogo no Brasileiro com os 10 primeiros.

Na largada do campeonato, o time fez 8 gols e sofreu 8. Somou 16 pontos.
Na sequência mais recente, fez 7 gols e sofreu 18, com apenas seis pontos.

Algo degringolou na defesa alvi-negra. As questões de intensidade e recuperação da bola sempre estiveram lá.

Nos 10 primeiros jogos, 128 desarmes certos, 20 interceptações certas e 108 faltas cometidas.

Nos 10 últimos, 130 desarmes, 20 interceptações e 142 faltas cometidas Quase tudo idêntico.

Apenas o aumento no número de faltas é um indicador importante. Uma média 14,2 faltas por jogo, como nos jogos recentes, colocaria o time como oitavo mais faltoso. Parece que a equipe não consegue mais se defender a apela para parar o jogo. Olhando para as finalizações sofridas, os números parecem confusos.

Blog do Téo: Téo Benjamin: Flamengo 4×1 Corinthians (análise da partida)

O Botafogo sofreu 151 finalizações lá no começo do campeonato para tomar 8 gols e 152 agora para tomar 18, mais que o dobro!

Era – e continua sendo – o time que sofre mais finalizações no campeonato! Aqui temos o nosso segundo indicador importante

Apesar de ter sofrido praticamente o mesmo número de finalizações, a quantidade de finalizações certas dos adversários saltou de 46 para 65! Um aumento de 50%! Me transporto de volta a uma noite na quadra do Tijuca, quando comecei a frequentar alguns jogos de basquete do Flamengo com amigos. Não entendia nada de basquete, mas percebi que os adversários arremessavam muito mal!

@dede_zon me explicou que o mérito era da defesa do Fla.

O time defendia de uma forma que permitia o arremesso do adversário, mas sempre marcado, pressionado e de uma zona ruim.

“Um profissional acerta a cesta se estiver livre na entrada do garrafão, mas a defesa faz ele arremessar mal assim!”

Essa ideia é transferível para o futebol se os adversários finalizam proporcionalmente mais no alvo – e marcam muito mais gols -, é pq a defesa está permitindo finalizações mais livres, em zonas melhores.

Esses foram os dois chutes de Marinho em 11 minutos na Vila Belmiro. Quantas chances assim vc acha que ele precisa?

Para entender o jogo do Botafogo, precisamos voltar a Barroca e seu porrete.

O treinador disse numa entrevista para O Globo que se colocassem duas pessoas para “sair na porrada” e um dos dois pudesse usar um porrete, ele gostaria de ter o porrete.

“A bola é como um porrete” De fato, Barroca tinha o porrete – ou a bola. Nos primeiros 10 jogos, teve 55,4% da posse e trocou uma média de 443 passes por jogo.

Teria hoje a 5ª melhor média do campeonato em ambas as estatísticas.

Mas o time finalizava pouco e fazia pouquíssimos gols -e isso incomodava. Uma pausa para voltar no tempo mais uma vez. Agora para a Inglaterra de 2011.

O pequeno Swansea City chegava à Premier League pela primeira vez em seus 99 anos de história.

Todos achavam que seria rebaixado rapidamente, mas o time de Brendan Rodgers terminou na 11ª posição.

O Swansea foi o time que menos cometeu faltas e menos venceu duelos aéreos. Ficou em 11º em roubadas de bola e 16º em finalizações.

Mesmo assim, levou 51 gols, mesmo número de Newscastle (5º colocado), 2 a mais que o Arsenal (4º). Não sofreu gol em 14 dos 38 jogos (4º melhor). Como? Foi o 2º time que mais trocou passes e teve a 3ª maior média de posse de bola.

O Swansea usava a bola para se defender. Se o adversário não tem a bola, não pode marcar gols, e Brendan Rodgers entendia isso melhor que ninguém.

A bola não era porrete. Era escudo. Ao fim do primeiro turno, Barroca deu outra entrevista, dessa vez ao Globo.com.

Adepto das metáforas violentas, disse que era muito difícil “tomar uma favela” portando apenas um estilingue com dez bolinhas de gude. Barroca identificava que tinha um problema de poder de fogo, e sofria uma pressão – talvez desproporcional – por isso.

Nas palavras dele mesmo: “em qualquer jogo eu vou jogar para ganhar, seja contra Fla, Palmeiras. Estou num clube grande. Não sou educado para jogar pelo empate” O Botafogo não quis ser Swansea. Oscilou, os resultados pioraram e Barroca caiu. Veio Valentim.

O número de finalizações subiu de 83 nos primeiros jogos para 97 nos últimos.
Mas o número de fin. certas subiu de 33 (40%) para apenas 36 (37%) e os número de gols caiu um pouco. O número de passes desabou de 443 por jogo (seria o 5º melhor do campeonato hoje) para 329 (seria 16º).

A posse de bola caiu de 55,4% para 49,2%

O Botafogo não se contentou com seu escudo. Queria um porrete, mas ficou sem nada! 

Sem a bola, há uma outra estatística que merece ser destacada.

Barroca conseguia manter uma defesa segura (7ª menos vazada do 1º turno) controlando muito bem a profundidade.

Sem a bola, há uma outra estatística que merece ser destacada. Barroca conseguia manter uma defesa segura (7ª menos vazada do 1º turno) controlando muito bem a profundidade.  

A defesa sabia “diminuir o campo efetivo” e deixar os adversários impedidos. Nos 10 primeiros jogos, o Botafogo conseguiu deixar o adversários em impedimento absurdas 34 vezes! 34 impedimentos em 10 jogos!

Média 50% maior do que o Flamengo consegue fazer com Jorge Jesus, que é tão bom nisso que triplicou a média de Abel – de 0,7 para 2,2! Já nos 10 últimos, essa mesma defesa alvi-negra conseguiu apenas 14 impedimentos. Caiu mais da metade!

O time não tem mais a bola, marca mais recuado, convida os adversários para o seu campo e não tem intensidade para pressionar e roubar a bola. A receita para um desastre! O Botafogo foi o time que mais mudou desde o início do campeonato. Se tornou um time sem identidade, quase inofensivo, que já perdeu a confiança.

Agora tem oito jogos para encontrar uma nova metáfora – violenta ou não – para o seu jogo.

O próximo desafio é contra o líder. 


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Téo Ferraz Benjamin
Autor

Escrevo as análises táticas do MRN porque futebol se estuda sim! De vez em quando peço licença para escrever sobre outros assuntos também.