Numericamente, o placar é, apesar de desfavorável, totalmente reversível. Há ainda o importante fato que ele obriga o Flamengo a atuar com seriedade.
Amigas e amigos, o ano finalmente vai terminar e chega enfim o momento de admitir: a temporada 2017 do Flamengo pode ter sido qualquer coisa, menos monótona. Para começar, basta ver o número de jogos da nossa equipe. Mais de 80. Isso é uma coisa boçalmente anormal.
Quando chegamos domingo passado para enfrentar o Vitória no Barradão pela última rodada do Brasileirão, vindos de uma guerra em Barranquilla contra o Junior, cheios de pressão pela tabela favorável a nossos adversários, tudo parecia conspirar para uma tarde trágica. O gol deles no primeiro tempo aumentou essa impressão. Mesmo com o empate que pintou aguerridamente no segundo tempo, parecia que fatalmente deixaríamos a vaga na fase de grupos da Libertadores nas mãos do Vasquinho, ironicamente comandado pelo Zé Ricardo. Seria um 7x1 moral.
Até que pintou o pênalti aos 49 do segundo tempo e Diego, nosso exausto maestro, colocou no filó, fazendo a Terra retomar sua rotação normal e podermos, aliviados, comemorar o que no início do campeonato parecia não ser mais do que obrigação e acabou se tornando uma façanha e tanto.
No entanto, mais uma vez, temos que ver os dois lados da moeda. Foi muito mais suado do que a gente queria, foi muito pouco perto do que nosso investimento financeiro ambiciona. Porém, todavia, entretanto, fazia dez fucking anos que o Flamengo não disputava duas edições seguidas da Libertadores. Ou seja, apesar de muitos terem soado as trombetas do apocalipse, guardem suas cornetinhas porque é um fato sim a ser, no mínimo, respeitado. Eu comemorarei.
Sobretudo porque, como todos sabemos, estamos depois de dezesseis fucking anos estamos disputando uma final continental. A casca e maturidade que esse elenco está ganhando nos dá esperança que, devidamente reforçado, nossa participação na Libertadores do ano que vem há de ser muito melhor.
O Flamengo no Maraca
Dito isso, chegamos ao que interessa. O resultado do jogo de quarta-feira passada na primeira perna da maior final continental do ano acabou sendo a cara desse time de 2017: não foi bom, também não foi uma merda.
Numericamente, o placar é, apesar de desfavorável, totalmente reversível. Há ainda o importante fato que ele nos obriga a jogar a volta para vencer, algo cem porcento necessário para que o Flamengo atue com seriedade e evite mais um episódio da insuportável série “palhaçadinhas históricas jogando em casa”.
Porém, todavia, entretanto, o chato foi que assistindo a partida, não teve como não pensar que se esse time continua sendo um caso a ser estudado. Mesmo nosso plantel sendo muito mais experiente que a molecada que o Independiente mandou a campo, em determinado momento parecia que os garotos éramos nós. Uma puta falta de cabeça no lugar que fez uma partida que começou dando pinta que seria inteiramente nossa, com os adversários nervosos, tomando gol de cabeça logo no início, sofrendo pra manter a bola no pé, acabar parecendo que poderia ter sido uma tragédia.
Muitas vezes eu olhava aquilo e pensava que louco seria se o Flamengo tivesse laterais. Sério. Trauco até tem um bom passe, certa habilidade e visão de jogo, mas é das figuras menos capazes de marcar alguém que eu já vi numa linha de defesa. Pará parece que gastou tudo que tinha pra dar no começo do ano. Vive perdido em campo, cansado, consciente de suas muitas limitações. Complicado isso. Espero que a diretoria esteja pensando em soluções para o ano que vem.
Assim como aguardaremos ansiosos a apresentação do futebol do Éverton Ribeiro, que evidentemente ainda encontra-se preso na alfândega. Sabendo do seu inegável talento, o que temos visto ser apresentado é caso para exorcismo.
Enfim, quarta-feira que vem a volta é no Maracanã, e esse é o maior de todos os reforços possíveis. O elenco teve finalmente algum tempo para se recuperar da maratona e tudo nos leva a acreditar positivamente que na derradeira apresentação do ano, enfim poderemos ter certeza que a temporada foi vitoriosa e digna de recordação em nossa história, ao vermos Réver e Juan juntinhos, levantarem o caneco.
Falta pouco. O caminho não foi fácil. Mas vai valer a pena.
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Duas notas importantes antes de acabar:
Primeiro, a notícia que começou a ser ventilada que Rueda já estaria dando meia-volta para Colômbia. Já é tradicional parte da imprensa tentar desestabilizar o grupo em um momento decisivo, nada de novo. Mas ver o nosso comandante deixar o futuro aberto em uma entrevista coletiva me deixou cabreiro. Torço para que a diretoria, se isso for mesmo verdade, esteja se movimentando para evitar que aconteça. O cara já mostrou que tem estrela e a probabilidade de fazer esse time encaixar no ano que vem é imensa. Perdê-lo agora seria um retrocesso e tanto.
Por fim, a triste notícia que Guerrero foi sentenciado pela FIFA com um ano de suspensão. Eu sou radicalmente contra essas “punições exemplares”. Penso que se o cara não tiver usado a droga, como sua defesa afirma, é uma sacanagem sem fim. E se tiver usado, só faz sua cabeça se perder e a chance dele se afundar é muito maior. Não tem qualquer viés humano. Piora quando pensamos que vai impedir um ídolo nacional de defender sua seleção que volta a disputar uma Copa do Mundo depois de 36 anos. Sobretudo essa punição sendo imputada por uma entidade sabidamente corrupta como a FIFA e em um torneio realizado na Rússia, país mergulhado em escândalos de doping. No mínimo incoerente.
Para nós, fica o amargo gosto de termos que nos despedir dele dessa forma. Seu contrato deve ser rescindido. Não foi o craque que a gente esperava em sua passagem, mas jogou com raça e nos ajudou bastante. Terá sempre meu respeito e torcida para que mantenha a cabeça no lugar e dê a volta por cima.
Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramaturgo em peças, filmes, novelas e seriados. É autor do romance “Gigantes” (Editora Paralela/Companhia das Letras - 2015). Siga-o no Twitter: @pedroneschling
Imagens destacadas no post e nas redes sociais: Gilvan de Souza / Flamengo
Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramat...