Blog Cultura Rubro-Negra | Por André Café — 2019. Como esses números mexem com a gente. Ano que o Flamengo incendiou ainda mais nossa paixão, que reverberou em gritos e folias das mais diversificadas figuras que compõem a Nação, que fez a alegria de velhas e novas gerações rubro-negras. Foi um ano de encontro: do próprio time, com sua história vencedora; de um futebol maravilhoso, poucas vezes praticada por um clube de futebol neste país e pela uníssona energia de mais de 42 milhões de pessoas, fazendo um oceano de boas vibrações e alegrias.
Mas engana-se quem acha que este texto é sobre 2019. O nosso ano mágico passou. É memória recente que deve ser guardada com todo carinho e referendada e defendida com unhas e dentes a quaisquer insinuações de desdém. Mas passou. Falamos isso com a convicção do peso que significa “cortar”, ainda que por apenas pragmatismo.
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Isso não quer dizer que desejamos um time acossado, entregue, afeiçoado a mediocridade em campo. Não é isso. Times vencedores são diversos. Podem sobrar, podem ter mais emoção que o devido para corações sensíveis, pode ter um futebol truncado, podem ser mais defensivos, não importa, há uma miríade de possibilidades de organizar um futebol que seja minimamente competitivo e esteja sempre na disputa dos primeiros lugares.
“Mas vocês não querem um time como 19? Estão negando o que esse time pode fazer?” Longe disso. É a certeza daquilo que este time pode fazer que nos dá a tranquilidade de processar uma espécie de luto referente a 2019 e pleitear, torcer, instigar, orar em tantos credos por um modelo de jogo ou por um time competitivo de 2020, pós Jorge Jesus.
Isso significa, para nós, que Rogério Ceni, atual técnico rubro-negro, não pode simplesmente tentar emular 2019. Ele tem sabedoria, mais experiência, potencialidades e um plantel com jogadores de alto rendimento. Há de se constituir aí, a forma, ou formas do Flamengo jogar. Evidente, que similaridades como intensidade, pressão pós-perda, ofensividade, são atributos que fazem parte do seu repertório. E por isso mesmo é reducionismo apenas recobrar 2019 nas mentes e corpos dos jogadores.
E isso se dá muito mais pelo contexto e condições particulares da atual temporada, como por exemplo: o planejamento de futebol parece, senão perdido, atordoado, sentindo golpes que poderiam ser mais rapidamente superados; o que remete por exemplo a condição física dos jogadores estar muito, mas muito aquém da temporada passada – só lembrar os buracos entre retorno do futebol, dias de folga, mudança de equipe técnica, demissão de alguns servidores do clube, dentre outros; junto a isto, um departamento médico que nem chega perto da desenvoltura de anos anteriores, especificamente 2019 (válido salientar que um staff, um extracampo precisa estar sempre em alto nível e atualizado, independente do ano).
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Ou seja, ainda que se fosse um desejo emular 2019, condições estruturais para que isso fosse possível aparentemente não se repetem na atual temporada. “Então é vestir o discurso pessimista e dar a temporada como perdida?” Calma lá galera, sem antinomias imediatas e sem nexo. O time está vivo em todas as competições. O elenco é qualificado e o Rogério Ceni entendeu rapidamente o que é ser Flamengo em vários aspectos. A temporada não está perdida. Ainda que soframos com muitas baixas por lesões e data FIFA, não dependemos de outrem pra decifrar os enigmas que estacionaram nosso avanço.
E há um fator, que por não ser mensurável é inócuo, mas para nós compõem a mística da flâmula vermelha e preta. Recordemos Rondinelli; Nunes e os gols das decisões; Petkovic aos 43, Angelim em 2009, Gabigol na final da Liberta e tantas outros momentos de viradas com a altivez da raça beirando os 1000%. É possível, é crível e vamos ver se nossa vontade se espalha pelo Brasil e chega ao ninho, para mais uma vez sermos felizes quando chegar o Carnaval.
Revisitando todas as potencialidades existentes e com a inteligência de 2020, forjar algo único, em uma temporada que é sui generis em desafios únicos. É o exercício de subir mais uma vez a montanha. O topo se fica pouco tempo, tem que subir novamente e a montanha se mostra outra desta vez (já diria Heráclito de Éfeso, em sua elaboração sobre o rio e o homem). Se achar que a montanha é igual, não chegaremos.
Com Lilian Porto – Twitter: @LilipanPorto6