Vencemos e ganhamos muito. Aprendemos a amar a figura folclórica, que se envolvia, que declarava a reciprocidade, que explodia em vibração
Blog Cultura Rubro-Negra | André Café – Twitter: @OrochiAndreCafe
Já não temos uma sexta-feira comum há muito tempo. Seja no âmbito geral de Brasil, na combalida política institucional; nas contradições do Estado e Capital, no contexto de uma pandemia severa; as pessoas se equilibram nas existências e resistências, com forças ainda para dançar, sim, pois é um alívio, são nossas fugas, as moradas de nossos amores intensos e paixões, são alguns dos motivos de risos e felicidade.
Quisera eu, parte também dessa dinâmica, está costurando mais uma crônica com um final óbvio, mas convincente, afável. Ou mesmo se estivesse a tecer argumentos críticos, estruturando uma análise conjuntural, num provocar para alçarmos voos impossíveis.
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Não, eu vim falar/dizer/sentir sobre essa nossa busca de sorrir nas emoções, naquilo que a gente ama. Uma porção que, que me arrepia, que dar dor de cabeça, lágrimas, alegrias, decepções; que duram um segundo ou marcam para sempre. Hoje o episódio é melancólico: vou pinçando palavras, enquanto minha irmã ouve ao longe Maria Betânia maltratando em sua versão de “As canções que você fez pra mim”, de Roberto Carlos. – Mas que coisa! Não era nesse tom o que eu queria dizer! Mas o que eu quero contar? – Suspiro. Textos, análises, queixumes e chorumes sairão aos montes. Nesta sexta, também incomum – porque o Flamengo é pauta de estremecer os brios a qualquer instante – marcamos o fim da era Jorge Jesus no Mengão.
Vencemos e ganhamos muito. Aprendemos a amar a figura folclórica, que se envolvia, que declarava a reciprocidade, que explodia em vibração. E isso era turbinado ao campo. 2019 sensacional, 2020 começando com mais vigor. Muito bom ser feliz, muito bom retomar a trajetória de um clube campeão. Evidente, que em torno disso, tantos problemas – que já discutimos em outros textos – que nos deixavam tão mal, mas que a convicção da proposta JJ de time vencedor era um alento. No contexto de pandemia, tornou-se ainda mais, embora quem vos escreve foi/é contrário ao retorno do futebol.
A saída do técnico português deve ou pode ser encarada como algo normal que acontece cotidianamente no futebol. Ou o mais correto é dizer ‘deveria ou poderia’. O retorno do futebol no Rio de Janeiro para findar com o Estadual, com disputas jurídicas, alinhamentos políticos do Flamengo com consequências ainda por mensurar, extra campo em polvorosa e, ao lado do campo, um treinador distinto daquele que estávamos acostumadas, acostumados. – Então é isso que você quer dizer? Que foi por estas questões?
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Calma lá, estou aqui num exercício de lidar com meus demônios em festa, catando impressões e sentidos. Poderia evocar Pierre Weil e replicar: “o corpo fala!”, listando gestos e olhares que denunciariam o que estava por vir. Mas não, eu sou só mais um rubro-negro balançado, me equilibrando nas reflexões. Há um universo complexo na torcida que vai de “obrigado, mister” a “vai te embora, traíra”.
O processo foi complicado, convenhamos. Vibramos com a renovação, ganhamos mais um título. Seria uma saída pela porta dos fundos? Dinheiro? Problemas pessoais? Conflitos? Uma sorte de conversas mal ditas ou não ditas turvou tudo. Ainda que esteja engasgado por saber o porquê, mais importante pra mim é como vamos ficar.
O Flamengo é gigante, acima de tudo, ele. E estamos nos empenhado para máxima do patamar se consolidar. Precisamos desta robustez. Devemos incomodar em todas competições. Precisamos pensar e ser grandes. Mas pra isso, além dos resultados, é preciso caminhar para plenitude em outras searas. Complicado não ficarmos com um legado mais completo, pois Jorge Jesus levará toda comissão técnica e deixara pouco ou quase nada.
Fora isso, o dito pelo não dito não deveria ser a tônica de uma instituição da magnitude do Flamengo. A mídia esportiva irá nos pautar, cumprirá seus agendamentos e linhas editoriais, suscitará histórias e contos, que por vezes não são mais que meras ilações. Ficar a reboque disto, nunca; informar, falar de peito aberto – pois somos 42 milhões famintas e famintos pelo bem estar do clube – é fundamental, esvazia linhas acessórias de conversas fiadas e prepara todos ao máximo para o inesperado.
Por hora, vemos a história acontecer pelos nossos olhos: vai-se Jorge Jesus, escolha dele; obrigado pelo trabalho, boa sorte … vamos erguer a cabeça e seguir? No fim das contas, a torcida sempre estará contigo, Mengo. E você sabe o poder do nosso barulho e o que desejamos. Imprescindível o sarrafo permanecer lá em cima; importantíssimo manter o foco para continuarmos no topo. Quem virá, deve saber que está vindo para reger, mas também cantar, ao sabor das vozes de uma Nação. E que possamos encrustar as contribuições para um modelo estruturado de organização e identidade de jogo.
Gritem, xinguem, chorem baixinho, quase calados. Agradeçam ou Demonizem. Tanto faz. Nossa história ninguém tomba, estão marcados os 23 de novembro, o hepta e oxalá, muito mais virá. O técnico fica no rol de nossas grandes conquistas, estampará bandeirões, quem sabe. Assim somos, assim é a Nação. Que sigamos com motivos de alegria, empilhando conquistas, torcendo, cobrando, sendo o que somos: o patrimônio imaterial do Clube de Regatas do Flamengo. E para conosco, nesta relação de ida e volta, tudo, Flamengo.