Que time é esse?

28/10/2017, 12:11

Vou ser sincero com vocês: eu cansei de tentar decifrar o Flamengo 2017. Essa esfinge me devorou.Trata-se de uma equipe capaz de fazer um primeiro tempo auspicioso, cheio de atitude e lampejos de bom futebol, como foi o de quarta-feira, e em seguida voltar para a segunda etapa como se não tivesse mais nada a realizar dentro de um campo gramado com duas balizas uma de cada lado.

Às vezes, como no primeiro tempo em questão, eu vejo esse time jogando e penso que a gente pega pesado demais com os caras. Que nossas expectativas são sempre tão gigantescas que esquecemos que eles são apenas bons jogadores, muitos dos quais superestimados, vestindo a camisa mais poderosa do mundo. Que se esforçam para cumprir a missão, fazem tudo que podem mesmo que seja menos do que a gente gostaria.

Mas logo em seguida, como na tenebrosa etapa complementar, penso que não. Nada disso. Não é possível que corra sangue nas veias de uns sujeitos tão sem pegada. Um bando que atrai um adversário evidentemente inferior em qualidade técnica para dentro de seu campo de defesa, quase que implorando para levar um gol de empate em uma partida decisiva.

Ao fim do jogo, vi nossos jogadores festejando o resultado, exaltando a própria “garra” e dizendo que jogaram “com o regulamento” já que a contenda era fora de casa e tinham feito um gol. Ora bolas, fiquei ainda mais confuso. Se a partida era fora e já tinham feito um gol, melhor então era continuar atacando e tentar marcar um segundo que nos colocaria em vantagem muito mais evidente, não? Se existe algum momento mais propício a se defender — coisa que eu não acredito —, não seria justamente no jogo de volta, quando o gol dos caras (Deus nos livre!) vale dois?

Mas o time que temos hoje é esse aí. Comandado por um técnico vitorioso que fala tudo certinho nas entrevistas, reafirma a necessidade de reviver a mística rubro-negra, mas coloca Márcio Araújo no lugar de um atacante.

Não estou cornetando o Rueda. Mesmo. Não acho que o colombiano tenho culpa de nada, coitado, chegou nessa no meio da maratona e não teve tempo real para implantar seu trabalho. Além disso, se os figuras estão no elenco sendo pagos, é porque têm que jogar. Mas acredito sim que suas ações e decisões precisam começar a acompanhar o seu discurso. Assim como é fundamental que se a diretoria de futebol quiser que esse projeto dê certo, deixe claro para o elenco que se ficarem meia-trava com el comandante, vão vazar antes dele.

A temporada que vivenciamos é irritantemente a cara desse grupo: não acelera nem descamba. Hoje teremos mais um clássico contra o Vasco pelo Brasileiro, que tem importância fundamental para nossa pretensão de terminar essa modorrenta competição no grupo que disputará a Libertadores, mas o novo jogo do ano é mesmo quarta-feira que vem contra o Fluminense, quando teremos a chance de chegar a uma semi-final continental pela primeira vez desde 2001.

Entendam de uma vez: desmerecer a Sul-Americana é uma toperice sem tamanho. Trata-se de uma competição internacional, algo que nosso DNA exige que vençamos toda hora mas que não acontece há quase16 fucking anos.

Sem falar que essa taça deixou de ser “sem importância” há algum tempo. Rende um prêmio generoso em dim-dim (16 milhões de golpes), vaga direta na obsessão Libertadores e disputa da Recopa, outra oportunidade de caneco internacional além de mais grana. Portanto parem com essa baboseira de “série B das Américas” e entendam que ganhar essa porra deve ser foco total e absoluto enquanto for uma possibilidade.

O momento é de ter fé, pedir que São Judas Tadeu nos guie e proteja. Nos livre dessa urucubaca esquisita que tenta se apossar da nossa alma há algum tempo. Esse time deveria jogar com um ponto de interrogação em cima do escudo. Pode ser que seja o Flamengo mas ainda não dá para termos tanta certeza disso. Vamos então torcer que é o que nos resta.

 


Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramaturgo em peças, filmes, novelas e seriados. É autor do romance “Gigantes” (Editora Paralela/Companhia das Letras - 2015). Siga-o no Twitter: @pedroneschling
 

Imagens destacadas no post e nas redes sociais: Gilvan de Souza / Flamengo


Partilha
Pedro Henrique Neschling
Autor

Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramat...