Sérgio Vieira
Eu tenho duas paixões: Flamengo e Faroeste. E vou mostrar pra vocês como as histórias do velho oeste estão entrelaçadas com o nosso Mengão. Sempre que possível iremos fazer paralelos entre um momento específico do Flamengo e uma obra de Western, seja um bom livro, seja um filme premiado!
— Olhe bem para Russel. Nunca mais em sua vida você verá outro como ele.
No romance de faroeste Hombre, de Elmore Leonard, essas são as palavras usadas por um dos personagens para explicar John Russel. É ele o ‘Hombre’ do título da história. Russel é um mestiço, meio branco, meio apache, que pouco se importa com o destino dos outros, basta o seu. Ele precisa viver entre dois mundos, entre duas culturas, e sobreviver num ambiente hostil e repleto de desconfianças. Assim é John Russel.
Assim é o Flamengo.
Sim, o Flamengo. Meio branco, meio índio, meio preto, meio amarelo, sempre vivendo em todos os mundos e culturas. Mas ao contrário de Russel, que em determinado ponto da história tenta rejeitar uma de suas “metades”, o Flamengo não rejeita ninguém. O jornalista Mário Filho, que dá nome ao templo do futebol, já explicava para os sem malícia que o Flamengo era o clube mais amado do Brasil pelo simples fato de que ele, Flamengo, se deixava amar à vontade. O Flamengo não está divido entre o índio e o branco, o preto e o amarelo. O Flamengo aceita o amor de todos e segue adiante.
Mas volto para Russel. Assim como ele, o Flamengo também precisa sobreviver num mundo hostil. Ambos se importam tão somente com seus destinos. Ao Flamengo é desimportante a falência moral e financeira de seus rivais. Talvez o Flamengo até perguntasse a cada um deles, em tom de blague, se não queriam tomar vergonha na cara e honrar o futebol do Rio, sabendo que nenhum deles aceitaria. Nossos rivais que sempre tentam se definir como a torcida que não tem esse tipo de gente, que não tem aquele tipo de sujeito. O Flamengo os recolhe, os rejeitados, os desprezados. Cada John Russel hostilizado pelo mundo que clama por pureza e linearidade é abarcado pelo Mais Querido. Talvez por isso o torcedor arco-íris nunca possa compreender o Flamengo. Apenas conhecê-lo.
O Flamengo faz o que acha que deve ser feito, como Russel. Durante toda a história John Russel não se altera, não confunde seus sentimentos, embora quem o conheça nunca mais volte a ser a mesma pessoa. Assim também acontece ao torcedor rubro-negro: após o primeiro contato com o Clube de Regatas do Flamengo, provavelmente proporcionado por um pai também rubro-negro; após presenciar o primeiro gol flamengo num Maracanã lotado; após se sentir como que apunhalado ao ver o ai-Jesus sofrer um gol; após o primeiro contato com o Flamengo, repito, o rubro-negro se altera para sempre.
As palavras que descrevem John Russel poderiam também ser usadas por um rubro-negro para explicar o Flamengo para algum gringo que por aqui estivesse:
— Olhe bem para o Flamengo. Nunca mais na vida você verá outro como ele.
E não se trata de mera aparência, fique entendido.
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Sérgio Vieira é Mengão, fã de velho oeste e escreve histórias de faroeste no seu blog http://poeiraepedra.blogspot.com