Houve um tempo em que era mais fácil torcer para o Flamengo, pois a história do Clube era facilmente relacionada com a base social de sua Torcida. Para entender o que transformou uma agremiação de regatas nessa entidade do mundo dos esportes há que se abrir mão dos recursos tecnológicos atuais e enxergar um mundo bem mais modesto em termos de comunicação.
Imaginem um time que nasce sem a menor estrutura e é obrigado a treinar em uma praça pública. Mas não é uma praça qualquer, esta está localizada diante de uma “favela”. Essa aproximação traduziu-se em uma constante relação do Flamengo com as camadas mais populares. Fico pensando o que foi o primeiro Fla-Flu, todo recheado de expectativas. O resultado foi frustrante, derrota por 3x2. Mas o impacto daquele resultado negativo nem chega aos pés de uma simples derrota para um outro tricolor nos dias atuais...
Bem, nossa história passa por confrontos ao colonizador português, que caracterizaram os primeiros “Flamengo x Vasco”, e pelas derrotas para o Santos de Pelé, em pleno Maracanã. O Botafogo, por sua vez, só tem história por que existe o Flamengo. No auge de seu futebol, as maiores conquistas são justamente as vitórias sobre o rubro-negro, o que coloca o Botafogo no mesmo patamar histórico do América do Rio. E falo com propriedade, pois amarguei alguns insucessos contra o time de Lamartine Babo.
Lamartine é a prova de que o futebol do Rio de Janeiro sempre foi diferente dos demais praticados Brasil afora. Imagine um torcedor do América fazer os hinos consagrados do Flamengo e de seus principais pretensos adversários cariocas.E não parou por aí. Bangu, Madureira, Olaria, Bonsucesso, Canto do Rio e Bonsucesso foram outros times cariocas presenteados pelo compositor.
Eu comecei a torcer para o Flamengo ainda em uma era em que nossas grandes conquistas se limitavam a campeonatos cariocas e torneios internacionais. O Campeonato Brasileiro era algo muito diferente do atual. Na década de 70 definitivamente o Flamengo não era um dos protagonistas. Em 1979, quase foi. Aquela geração que surge a partir da derrota para o Vasco nos pênaltis (sim, já perdemos decisões para o cruzmaltino), por pouco tinha sorte maior, mas na ocasião esbarrou no Palmeiras.
Ainda sem TV’s a cabo, a década de ouro rubro-negra inegavelmente é a de 80. O Flamengo de Zico ganhou tudo que disputou. Mas não era apenas o Zico. Nosso time campeão brasileiro em cima do Atlético Mineiro era majoritariamente composto de jogadores oriundos da base. Ocorre que as vitórias não vieram por acaso. Antes das grandes conquistas o Flamengo passou por um rearranjo financeiro e a persistência em manter o trabalho iniciado em 1974.
O futebol até meados de 1987 tinha sua transmissão muito restrita. Afinal, não havia TV por Assinatura no Brasil. Internet não existia em termos comerciais. Jornais, revistas e rádios eram os principais divulgadores do futebol brasileiro. Uma outra característica daquela época é que os craques do futebol brasileiro saiam para o exterior em idades mais avançadas. Zico, por exemplo, só saiu do Flamengo após a conquista nacional sobre o Santos.
A grande maioria dos torcedores rubro-negros não teriam como ser ouvidos naquele período. Já o torcedor atual, por mais desconhecido que possa ser, consegue ter voz em qualquer rede social, pode criar uma rádio, ter um blog, um canal no Youtube e se transformar em um porta-voz do apocalipse, um locutor do Purgatório. O torcedor da arquibancada foi elitizado e o do rádio de pilha gradativamente vem sendo distribuído e ampliado para as transmissões em bares, lares, e links legais ou piratas. Tudo isso reunido se constitui em um verdadeiro paraíso para os cornetas, que seguem ao sabor das vitórias ou derrotas para sempre criar sofismas, e dessa forma justificarem suas posições.
A importância de disputar a liderança
O Flamengo que nasceu em 1974 era mestre em vencer competições em suas fases decisivas e/ou de mata-mata. O Clube pós 2005 se torna inconstante e instável, com flertes esporádicos com a Segundona. Em 2008 o Flamengo chegou a liderar o Brasileirão, com um futebol de encher os olhos. Todavia, a saída de 4 ou 5 jogadores destruiu os sonhos de conquista.
Veio 2009. Conquistamos o Campeonato Brasileiro por pontos corridos. E o time foi volátil, que chegou a levar duas sonoras goleadas para Sport e Coritiba, situações que derrubaram o técnico Cuca. Andrade assume interinamente e se mantém no cargo. O resultado todos sabem: caneco!
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Para ter conquistas consecutivas, os times do Flamengo devem cultivar o hábito de sempre estar na faixa de cima da tabela. Só que esse papo de disputar vaga em Libertadores é balela. O Flamengo, por sua história, pelo seu investimento, pela e para a Magnética tem que sempre lutar para ser campeão, seja qual for a competição. Esse espírito vencedor, de nunca aceitar a derrota como uma coisa normal é o que notabilizou a geração que surgiu em 1977.
Já contei a história de nossa vitória sobre o Real Madrid no Torneio Palma de Mallorca, em que o árbitro expulsou três jogadores do Flamengo, além do treinador, do preparador físico e de todos o banco de reservas do rubro-negro. Foi esse Flamengo que me forjou. Por isso que acredito em nossa capacidade de superação. O Flamengo com espírito de campeão e fome de vencer tudo o que disputasse nasceu naquele dia que Zico nem em campo entrou.
Daqueles tempos pra cá uma coisa mudou assustadoramente. No seio de nossa torcida surgiram torcedores com o estranho comportamento de questionar o time do Flamengo, seja nas derrotas, seja nas vitórias. Esses torcedores fazem o papel que outrora deveria ser dos adversários, que tinham muita vontade de desmerecer nossas conquistas, mas se omitiam por vergonha. Nos dias atuais há uma cobrança insana para que O Flamengo jogue bem todas as partidas, mesmo diante da imprevisibilidade que caracteriza as competições do futebol profissional jogado na América do Sul.
Concluo ratificando que as maiores conquistas consecutivas, ou não, da história do Flamengo vieram seis anos após as mudanças com o surgimento da gestão da FAF a partir de 1974. E que, enquanto ficamos sonhando com ano mágico, gradativamente se consolida um Clube com a força capaz de trazer atletas da qualidade de Everton Ribeiro e Vitinho. E o melhor de tudo, a base começa a novamente revelar jogadores com o apetite vencedor. O vencedor mira as vitórias, os perdedores visam os vencedores.
O dilema de agosto
Aguardarei o fim do primeiro turno do Campeonato Brasileiro para fazer uma análise comparativa das equipes. Suas performances e perspectivas. Hoje ficarei restrito a grande dúvida diante da sequência de jogos decisivos ao longo do mês de agosto.
Creio que todos sonhamos com a conquista das três competições: Copa do Brasil, Taça Libertadores da América e Campeonato Brasileiro. Em princípio não queremos poupar ninguém, porém o pragmatismo nos leva a conclusão que a possibilidade de perda de jogadores é real, principalmente do meio campo. Para reflexão, eu farei algumas considerações:
1) Nossas chances de passar pelo Cruzeiro na Libertadores são grandes. O problema é o que vem depois. Considero o chaveamento do nosso lado muito complicado. Essa competição é de longe a de pior logística;
2) Nossa chances de passar pelo Grêmio na Copa do Brasil dependem do grau de dedicação do tricolor gaúcho em relação a essa competição. Temos que apostar que o apetite deles pela Libertadores é suficiente para retirar o foco. No meu entender o Grêmio é a equipe que mais se assemelha em termos de qualidade de meio campo ao time do Flamengo. Financeiramente seguir na Copa do Brasil é espetacular, e, passando pelo Grêmio nossas chances de conquista são significativas;
3) Fazemos a melhor campanha até agora no Campeonato Brasileiro, dentre todos os participantes. Nesse momento o Flamengo tem 70,8% dos pontos disputados. Nosso elenco é qualificado e joga um futebol com tendência a evolução. O trabalho do técnico Barbieri certamente surpreendeu e conquistou a Magnética. Que eu me recorde, na única partida em que poupamos, perdemos.A meu ver, aqui é força máxima sempre.
E nosso elenco? Suporta a maratona? Bem, ao que parece, a chance de Guerrero sair é grande. Nesse cenário, como abrir mão do Henrique Dourado? Acredito inclusive que o Ceifador pode ser muito importante nas competições que podem ser decididas em pênaltis. O Flamengo necessita de opções no ataque. Marlos, Uribe, Lincoln, todos são importantes opções para nos ajudar a solucionar o doce problema para o treinador.
Nosso grande problema está no meio campo. Hoje não temos reservas a altura para Cuellar, Paquetá, Everton Ribeiro e Diego. E pensar que fui a loucura quando pediam a cabeça dos dois últimos. Pior, como que Cuellar era banco do Inominável? Serei eternamente grato a Rueda e Barbieri por enxergarem a luz e descobrirem o caminho para o menino Paquetá...
Nas laterais, não teremos mudanças. Nenhum Júnior, Leandro ou Toninho chegará para jogar no lugar de Renê e Rodnei. Mais uma vez méritos ao nosso treinador. Ele arrumou o time a ponto da avenida do lado direito não ser o caminho das pedras para os nossos adversários. O que temos que torcer é para a base nos presentear com novos talentos, como ocorreu com o lateral esquerdo Jorge.
Na zaga, apesar da visível dificuldade de Réver em acompanhar atacantes mais agudos, ele ainda possui liderança e alguma qualidade técnica. Não será fácil simplesmente barrá-lo, como querem alguns. Também temos que ter cautela ao criticá-lo. Ele não merece ser vaiado ou hostilizado. Barbieri saberá o que fazer. E o grupo mantém um enorme carinho por ele.
No gol rubro-negro temos um profissional que mantenho enorme admiração desde os tempos de Atlético Mineiro. E quem me conhece sabe que isso é uma raridade. Diego Alves, além da enorme qualidade técnica possui uma liderança que me impressiona. Queria muito que Julio Cesar estivesse com o time, mesmo sem jogar. A experiência desses caras pode ajudar muito na formação dos jovens goleiros do Flamengo.
Em síntese. Temos um elenco limitado para encarar as três competições. Sonho com a conquistas de todas, mas creio que, em ordem de chances, o Brasileirão está mais viável, a Copa do Brasil bem atraente e a Liberta mais imprevisível.
Volto na semana que vem!
Cordiais Saudações Rubro-Negras!
Imagem destacada nos posts e nas redes sociais: Gilvan de Souza / Flamengo
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Ricardo Martins é corretor de seguros, carioca radicado em Belo Horizonte. Blogueiro de longa data, comanda no MRN o blog Mulambeiros - Mulambos Mineiros. Siga-o no Twitter: @Rick_Martins_BH
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Administrador de Empresas, Flamenguista puro sangue, Consultor de Benefícios especializado em Previdência Privada e apaixonado pela vida!