Alguns questionamentos acerca da capacidade do Flamengo de pensar integralmente a formação do seu time
As altas cifras envolvendo o futebol aumentaram o nível de competitividade e exigência do jogo. Ganhar é mais do que uma questão esportiva, de competição: é uma questão financeira, de sobrevivência. Investimento alto espera retorno e gera expectativas e pressão. Ocorre que, a montagem de um time não é processo simples. Mais do que nomes e individualidades, é preciso harmonia, sincronismo entre as peças para que o todo funcione e, aí sim, as individualidades apareçam.
A construção desse processo é algo cerebral, que conta sim com uma pitada de acaso (jogadores que excedem as expectativas, superando o rendimento esperado), mas que não acontece ou se sustenta a longo prazo por casualidade. Quantas vezes ouvimos falar de um grande elenco que “não deu liga” e de um time que, independente das peças que entram e saem, executa o seu jogo à risca?
O Flamengo nunca se caracterizou por ser um bom vendedor, fama que envolve muitos fatores. Será que um deles é a maneira como o time é construído? Meu argumento é que o que ocorre – ao menos nos últimos anos – é uma mera adição de peças com um único critério – ocasião de mercado – e quando os jogadores aqui chegam, de diferentes formas acabam se desvalorizando no clube, o que impossibilita boas vendas.
Quando perdemos Elias, Márcio Araújo chegou. Estava sem clube e o treinador na época, Jayme de Almeida, disse que os jogadores tinham as mesmas características, comparação que o próprio Araújo refutou em sua apresentação no Mais Querido. Caso claro de pegar a reposição mais fácil no mercado sem olhar as funções táticas e papel no time. Outro exemplo de ocasião de mercado foi o Henrique Dourado. Houve investimento alto, mas na necessidade de um centroavante, o clube fez o “óbvio”, buscando o artilheiro do último Brasileirão, diante de uma ocasião de mercado: crise financeira do Fluminense. De artilheiro do BR já tivemos Dill, Souza, Dimba, Josiel... qual foi o critério para a contratação? O time vai jogar em função das potencialidades desse jogador para maximizar seu rendimento? Ele tem características que vão potencializar o desempenho do time?
Mesmo quando acerta e há otimização de performance, o Flamengo perde o timing de tirar proveito da valorização. Paulinho, que veio a custo baixo e foi muito bem em 2013, principalmente na Copa do Brasil, é um exemplo: Flamengo negou proposta de R$15 milhões do Al-Ahli, em maio de 2014, para ver o jogador cair de produção, ter problemas disciplinares e ser emprestado ao Santos em 2016, saindo do clube pela porta dos fundos e sem retorno financeiro.
Há ainda casos de jogadores que chegam ao clube vindo de alta performance e caem de rendimento por aqui. Com diferentes níveis de badalação, mas todos com certo grau de boas atuações chegaram, como Guerrero (que até deu declarações de que a falta de estrutura atrapalhava o rendimento), Marcelo Cirino, Canteros, Mancuello, Arão, Donatti, Trauco, Rômulo, etc.
É preciso relativizar, visto que há muitas variáveis envolvidas, como extracampo (vida noturna), questões pessoais, psicológicas, etc. Mas chamam atenção dois fatores:
1) a queda de rendimento desses e outros nomes por um encaixe tático deficiente, ou do jogador em si, ou do time como um todo. Diego e Éverton Ribeiro estão colocados nas condições coletivas ideais para ter o rendimento individual? São os mais cobrados e se saírem daqui por “fracasso”, podem brilhar em outros clubes com o encaixe certo. Alguém duvida? O caso da simples mudança de posição do Paquetá nos últimos dois jogos fez o garoto aparecer ainda mais e ilustra bem essa equação.
2) a incapacidade do Departamento de Futebol em perceber internamente – mesmo após contratação – que o jogador não atendeu/não atenderá as expectativas, e negociá-lo com algum valor de mercado, não esperando assim a total desvalorização do mesmo. Os casos de Cirino e Rômulo ilustram isso: eram jogadores desejados no mercado, não renderam. Um já saiu de forma onerosa para o clube. O segundo permanece, mas não aparenta que deixará qualquer tipo de retorno em sua saída. Trauco, após vir com status de seleção e promissor, “já não serve mais”. Teremos recuperação técnica ou retorno financeiro com ele?
Imagem destacada no post e redes sociais: Gilvan de Souza / Flamengo
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