Por Daniel Endebo (twitter: @danisendebo)
Saí de casa por volta de 20:15, num daqueles dias em que o calor carioca não dá trégua em nenhum momento, na expectativa de me divertir. A semifinal do campeonato carioca de 2014 trazia boas lembranças e a colocação atual da Cabofriense indicava uma fragilidade ainda maior. Era natural esperar que o Flamengo escancarasse o adversário em pouco tempo e premiasse os bravos heróis (pouco mais de 11 mil) que se deslocaram ao Maracanã nessa quarta-feira.
Cheguei com a bola rolando, graças a um estúpido sistema que unificava e logo me pus a analisar o time que entrara em campo. Paulo Victor voltava à meta flamenga, enquanto Gabriel substituía Nixon no lado direito do ataque. De resto, mesma formação dos últimos jogos.
Um olhar rápido para o campo indicava um alinhamento que, se não for corrigido rapidamente, será uma dor de cabeça tremenda para Vanderlei Luxemburgo num futuro breve. Com a bola, o Flamengo se divide em dois: um bloco entre os quatro defensores auxiliado por Márcio Araújo e Canteros; e outro, com o tridente ofensivo acompanhado de perto pelo jovem Arthur Maia. Sem a bola nos pés, os jogadores até se alinham em seus setores, mas o distanciamento entre eles é flagrante: os 10 homens de linha marcam o adversário em um espaçamento de 50, 60 metros, pelo menos.
Desse posicionamento, nasceu a dificuldade criativa do Mengão na primeira etapa. O calor pode ter contribuído, mas a falta de velocidade na transição e troca de passes fez com que o fraco adversário se protegesse bem das investidas rubro-negras. Na única trama bem desenvolvida do primeiro tempo, o Mais Querido abriu o placar. Ainda que forçada pela contusão de Anderson Pico, a entrada de Luiz Antônio melhorou o setor ofensivo.
O time mudou de vez, entretanto, quando sofreu um gol na segunda etapa. A preguiça habitual de um jogo que pouco vale foi deixada de lado e o time foi à forra. Em duas cobranças de escanteio, o Fla abriu vantagem; primeiro com Éverton, depois com Samir, que falhara no gol do time de Cabo Frio. Com a porteira aberta e o adversário desnorteado, a tarefa ficou fácil.
Alecsandro e Eduardo da Silva entraram nos lugares de Gabriel e Arthur Maia, respectivamente, e se aproveitaram do cenário que se apresentou. Éverton e Marcelo pintaram o sete pelas pontas e construíram a jogada do quarto gol, marcado pelo Croata. O quinto, foi um presente de Cirino para Alecsandro, que perdera um gol claro minutos antes: a bola sobrou limpa para o camisa 7, que só rolou para nosso goleiro-linha fechar a conta.
Voltei do Maraca com a sensação de dever cumprido: o bom número de bolas na rede sempre animam e algumas atuações individuais me deixaram animado - especialmente a de Marcelo Cirino, que não só fez gol e deu assistência, como correu o jogo inteiro, criou oportunidades, variou seu posicionamento e marcou lateral adversário aos 45 do segundo tempo.
Liguei a TV para acompanhar a reprise do jogo e prestar atenção nos mínimos detalhes. Algumas conclusões soam óbvias, mas é importante destaca-las para arrematar o sentimento pós-jogo:
1. Arthur Maia teve participação destacada em lances capitais, mas ainda é muito cru. É habilidoso, mas toma decisões erradas com uma frequência impressionante. Talvez renda melhor com um time que use uma referência mais clássica, na qual ele possa tabelar por dentro.
2. Éverton, um dos mais regulares jogadores do nosso elenco, cai de produção em um time que transpira muito mais do que pensa. Ainda assim, é peça-chave nesse ataque. Do lado direito, Gabriel não foi bem; é voluntarioso, esforçou-se e, vá lá, vinha de contusão. Mas tal qual ocorreu com Arthur Maia, pecou pelas decisões ruins. Ah, e precisa acertar seu posicionamento urgentemente.
3. Samir, que a torcida transformou em "Samito" antes mesmo de o garoto completar 19 anos, precisa de I) uma companhia que o oriente melhor e II) ter os pés mais no chão. Em capacidade técnica, talvez seja o melhor defensor do clube, um potencial enorme. Mas tem cometido falhas lá atrás (escorregão contra o Macaé e batido facilmente ontem); não satisfeito, saiu gritando palavras de ordem e elevação do próprio moral quando marcou o gol. Calma lá, garoto.
4. Luiz Antônio precisa ser trabalhado na lateral. Isso não significa necessariamente descarta-lo no meio - embora eu acredite ser essa a melhor opção -, mas desenvolve-lo na posição não só nos poupará de investir no setor após a (provável) saída de Leo Moura como dará a ele a oportunidade de ter mais minutos de jogo.
5. Alecsandro e/ou Eduardo da Silva precisam jogar com mais frequência. São finalizadores natos e melhoram sensivelmente o poder de definição do Mais Querido. A não ser que Marcelo Cirino se desenvolva muito e rapidamente, ficará cada dia mais claro que o time é mais perigoso com um definidor.
Essas conclusões indicam uma única direção: é hora de testar. Mesmo que prefira não modificar o esquema o tempo todo, dar vagas cativas pra jogadores que ainda nem provaram ser merecedores de tanta moral, faz mal ao time. Temos no nosso elenco nomes como Alecsandro, Eduardo, Nixon, Paulinho, Mugni, Bressan, Luiz Antônio. A estrutura básica do time (Paulo Victor, Wallace, Márcio Araújo, Canteros, Éverton e Marcelo Cirino), já está pronta. Promover a disputa por posições obrigará os atletas a evoluir constantemente, dando uma noção mais real de quanto potencial existe nesse elenco. Mesmo que alguns jogadores não fiquem com o ritmo de jogo considerado ideal, a hora para errar é agora.
SRN