Homofobia masculina, patriarcado e futebol 

17/10/2024, 14:11
Conselheiro do Flamengo, José Carlos Peruano cometeu homofobia em vídeos direcionado ao candidato Bap

Nos últimos dias, algumas falas  de um conselheiro do Flamengo, em um grupo de sócios, repercutiram muito na Gávea e na imprensa.

Além das injúrias direcionadas contra um dos candidatos a presidência do Clube, e contra sócios e conselheiros, a indignação foi grande devido ao teor homofóbico e rapidamente repudiada por todos. Inclusive pelos candidatos adversários.

Ainda bem.

Mas o buraco é mais embaixo.

Porque a homofobia masculina persiste de forma tão sistemática no meio futebolístico?

MARION KAPLAN: As raízes do mal e o esporte como exemplo

Porque os coming out são tão raros no meio dos jogadores? Alguém realmente acha que atletas homossexuais são tão raros assim?

Porque as campanhas de conscientização sobre o tema são escassas nos clubes?

Porque os cantos homofóbicos persistem nas torcidas?

O racismo e até o machismo são muito mais combatidos. Por quê?

Analisando a questão do patriarcado, podemos provavelmente encontrar algumas pistas. Pois somos uma sociedade patriarcal, onde os homens são privilegiados, onde as mulheres são “apenas”  o segundo sexo, como bem disse a Simone de Beauvoir. Eles são os líderes, detém a autoridade moral, social, política e econômica.

Portanto ser homem significa ser poderoso, ser forte, ser viril.

E para a mulher, resta apenas a submissão.

Afinal ela é a penetrada. A possuída.

Ele é o dono. Domina.

Ela é a dominada.

Contudo, estamos em plena revolução paradigmática, onde o imaginário do patriarcado está sendo desconstruído e a heteronormalidade cada vez mais questionada. 

Não por acaso, estamos comemorando no mês de outubro o aniversário de 7 anos do movimento Me Too. Na ocasião, o todo poderoso da indústria do cinema americano, Harvey Weinstein, foi acusado por dezenas de mulheres de assédio e estupro, o que desencadeou uma onda de protestos, mundo afora, de mulheres demonstrando a prevalência generalizada da agressão sexual. Eu também fui abusada, eu também fui assediada, eu também fui estuprada. Eu também. Me too.

Mas o que isso tem a ver com a homofobia?

Tudo.

Se no patriarcado o homem é o todo poderoso, o macho que pode tudo, a mulher é a presa passiva e submissa. Portanto, qual maior injúria deferida de um homem para outro homem? Aquele que é penetrado, aquele que é submisso, a mulherzinha, o homossexual.

Ou seja, a homofobia nada mais é que uma vertente da misoginia. No patriarcado, héteros são másculos e desdenham das mulheres, seres inferiores e subjugados.

E homens homossexuais são vistos da mesma forma, só que com o agravante de ousarem contestar o patriarcado. Afinal são homens. Não podem ser penetrados. Não deveriam. É errado. Inaceitável. Intolerável.

Eis a razão pela qual se combate muito o racismo no futebol, o machismo cada vez mais, mas a homofobia raramente. Pois, se as mulheres contestam o patriarcado, os homossexuais contestam muito mais. Eles expõem algo considerado anormal para nossa sociedade que se vê estruturalmente heterossexual. 

Aceitar a homossexualidade,  em um meio tão predominantemente masculino como o futebol, significa que qualquer homem pode ser. Algo inconcebível para um ambiente onde homens não são  apenas grande maioria,  mas os códigos de condutas másculos sempre reiterados.

E voltamos à revolução paradigmática na desconstrução do patriarcado.

Somente ao rever esse conceito arcaico de um sexo dominando o outro, ativo/passivo,  soberano/submisso, poderemos nos libertar dos meios de opressão sistemática entre os gêneros.

Está mais do que na hora dos clubes de futebol, e o  Flamengo detentor de uma Nação de quase 50 milhões como protagonista, se posicionarem e construírem ações conjuntas contra a homofobia. Em prol dos homens e das mulheres.

A humanidade agradece…