Há muitas razões para acreditar

03/09/2019, 14:35

Não estou defendendo o oba-oba, afinal não temos nenhuma certeza do final dessa história, mas não deixem de curtir cada passo dessa saga.

Quando Jorge Jesus assumiu o Flamengo, mostrou logo ser o ótimo frasista que tanto alardeavam em Portugal. Entre suas pérolas, ao explicar os motivos de ter assumido o pouco usual desafio de cruzar o Atlântico para assumir uma equipe brasileira, citou sem constrangimento a grandeza do Flamengo o colocando entre uns dos cinco maiores do mundo (algo que todo mundo sabe que é verdade, mas poucos tem coragem de admitir) e citou a possibilidade de disputar o Mundial no fim do ano (algo absolutamente esperado, apesar de não acontecer há quase 40 anos). Em um momento em que anunciava seu estilo, cravou que um time como o Flamengo não basta ganhar: é preciso jogar bem.

Leia do mesmo autor: É impossível não se empolgar

Domingo assistamos entre incredulidade e orgasmos múltiplos seu enunciado virando realidade na massacrante e inapelável vitória sobre o bicampeão brasileiro Palmeiras. Todo mundo que assiste futebol está assustado com a evolução dessa equipe em tão pouco tempo sob comando do treinador luso. Mas, ao seu estilo, JJ disse em sua coletiva que a ele não importa o placar de um jogo. Que sempre o assiste vislumbrando os aspectos em que sua equipe pode e deve evoluir para atingir um nível mais alto de competitividade. 

Comparar o Flamengo de Jorge Jesus ao de Abel chega a ser covardia. Enquanto o time parecia que havia se conhecido no túnel que sobe para o gramado sob o comando do veterano torcedor do Internacional, com Jorge Jesus a cada partida os caras parecem entender melhor o que o treinador propôs como conceito de jogo, sabendo não apenas executar o que lhes foi designado como função, como perceber se algum companheiro precisa de auxílio na sua. Isso possibilita ainda, muito em função da versatilidade e talento dos que hoje vestem vermelho e preto, uma troca constante de posicionamento das peças em campo, confundindo e atordoado os adversários de maneira quase constrangedora.

Internacional e Palmeiras, duas equipes que primordialmente valorizam suas defesas — sim, os famosos retranqueiros —  e eram até os embates com o Flamengo elogiadas por sua virtual intransponibilidade, saíram dos confrontos conosco com uma real sensação de que o prejuízo que levaram poderia ter sido bem maior. Beeem maior. 

O Flamengo hoje é não só o melhor futebol jogado no Brasil — aceita que dói menos, Renato — , mas também provavelmente da América do Sul toda. O Flamengo hoje tem o melhor futebol jogado pelo Flamengo desde que me entendo por gente. 

Fica difícil explicar para a empolgação que nos toma de assalto a cada exibição de um time que passa a impressão de ter o adversário sempre acuado e assustado com seu poderio ofensivo, aliado a uma defesa cada vez mais segura apesar das escalações cada ofensivas do mister, que o concreto hoje é que nada está ganho.

No entanto, sem falsa modéstia que não cabe a quem torce para o Maior Clube do Universo e Arredores, a menos que aconteça algo muito inesperado, como uma série de contusões que abalem a estrutura do time (isola!), ou um cada vez menos provável encaixe magistral de um dos adversários — o mais estruturado nesse sentido é o Santos, mas as diferenças de elenco são abissais —, esse Campeonato Brasileiro, que privilegia a regularidade com seus pontos corridos, deve pela lógica mesmo acabar na galeria de troféus de Gávea. Sim, a lógica leva a crer que seremos campeões, não mais nossa grandiloquência estrutural.

Já a Libertadores é mata-mata. O melhor nem sempre ganha. Temos pela frente um Grêmio de pegada e mais experiente que nós nessa reta-final da competição. Será um desafio e tanto, promete dois jogos de altíssimo nível, justamente pela proposta dos caras de também se propor a jogar pra frente ao invés de esperar sei lá o quê. Passando por eles, e habib passaremos és, virá um gigante argentino em jogo único. Novamente, só sendo maluco para tentar cravar um vencedor.

2019, ainda na metade da temporada, se desenha como um ano mágico para nós torcedores tão sedentos por conquistas expressivas. Sabemos bem que não existe algo promissor que o Flamengo não seja capaz de estragar. Porém, observando a evolução dessa equipe e os já comprovados acertos da direção de futebol quando falamos de contratações e comando técnico, dá pra afirmar com alguma segurança que essa zika passou. 

Tão importante quanto encarar a tristeza com cabeça erguida é saber fruir a felicidade de braços abertos, sem receios. Estamos vivendo tempos felizes. Então sugiro a cada um dos irmãos e irmãs de paixão rubro-negra que aproveite cada segundo. Não estou defendendo o oba-oba, afinal não temos nenhuma certeza do final dessa história, mas não deixem de curtir cada passo dessa saga. Se eu tivesse que apostar todas as minhas fichinhas, diria que será memorável. Tenham fé.  


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Pedro Henrique Neschling
Autor

Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramat...