Gol é feito criança em supermercado: se perder demais vai ter trauma e gente chorando

Ainda que tenha a sua carga de subjetividades, o futebol, como todos os esportes onde você marca gols, tem um objetivo bem claro, uma regra bem óbvia: vence quem pontuar mais.
Se no surf tem um juiz que avalia seu desempenho na onda, se na ginástica vão dar notas pela qualidade dos movimentos, se no skate adultos vão estar ali julgando qual criança pulou mais certinho, no futebol tudo que importa é se a bola entrou no gol e se isso foi feito dentro das regras do jogo.
Gol de bicicleta vale tanto quanto gol de joelho, chute de 50 metros pontua o mesmo que empurrar a bola debaixo da trave, driblar inúmeros adversários e só não entrar com bola e tudo porque teve humildade em gol tem o mesmo resultado final que cobrar um pênalti rasteiro no meio com o goleiro pulando pro canto.
Ou seja, ainda que jogar bem seja obviamente a melhor forma de fazer muitos gols e com isso o caminho mais razoável para vencer as partidas, a verdade é que você jogar bem ou mal não vai fazer absolutamente a menor diferença se esses gols não saírem.
E o Flamengo, que vem jogando um futebol que faz o torcedor sonhar, quase foi, mais uma vez, atingido pelo rude impacto desse tijolo de realidade na partida deste domingo, contra o Vitória, pelo Campeonato Brasileiro.
Porque, como aconteceu nas duas últimas partidas, diante de Internacional e Deportivo Táchira, a equipe rubro-negra foi superior. O domínio territorial era visível, a diferença técnica era palpável, o volume de chances criadas era bem maior. Mas traduzir isso numa vantagem confortável no placar? Aí já era outra conversa.
A vitória magra por 2x1, com um gol decisivo de Bruno Henrique aos 41 do segundo tempo, trouxe à tona mais uma vez essa que é a grande deficiência do Flamengo neste ano, e que parece ter menos a ver com qualquer orientação ou treino de Filipe Luís e mais com nervosismo, azar ou talvez a necessidade de uma benzedeira para alguns atacantes: esse time segue perdendo muitos gols.
São chutes simples executados sem eficiência, são chutes complicados que parecem prestes a entrar mas batem na trave, são cabeçadas dadas com imensa liberdade e destinadas à linha de fundo. Não parece ser falta de esforço, não parece pouco treinamento, mas esse tipo de situação não apenas jogou dois pontos no lixo na estreia do Brasileirão como quase deixou mais dois em Salvador na noite de hoje, já que perdemos gols feitos, em jogadas bem armadas, mas o Vitória achou um gol de bola desviada num chute despretensioso.
A parte que realmente importa da temporada ainda está começando, temos jogadores voltando de lesão e se adaptando - e não podemos esquecer o lindo gol de Arrascaeta, em que o uruguaio errou o passe, roubou a bola de volta, driblou, chutou, e só faltou ele mesmo pular pra espalmar - mas nada disso muda o fato de que o Flamengo precisa, urgentemente, de mais eficiência ofensiva. Isso já fez falta antes e, com toda certeza, vai fazer mais falta ainda daqui pra frente.
João Luis Jr. é jornalista, flamenguista desde criança e já viu desde Walter Minhoca e Anderson Pico até Adriano Imperador e Arrascaeta, com todas as alegrias e traumas correspondentes. Siga João Luis Jr no Substack.