Flamengo é o nome do excesso de vermelho, da flama — e antes que alguém me corrija, citando o neerlandês vlamingen, vi num dicionário que vlam também é chama. No fundo, tudo se ajeita. O fogo é a razão deste clube (e já disse mil vez que o Brasil em brasa se abraça às flamas de seu principal clube e que a bandeira da pátria deveria ter ao menos uma estrelinha vermelha — e que o país não se tornará grande de fato enquanto não ajustar esse detalhe semântico em seus símbolos).
O Palmeiras é a homenagem às árvores da família Arecaceae, plantas com flor monocotiledóneas da ordem Arecales, com cerca de 2600 espécies, entre as quais plantas muito conhecidas, como o coqueiro e a tamareira. Sim, palmeiras são importantes. Quem não tomou buriti e comeu açaí geladinho, não fritou o frango no azeite de dendê, não comeu o palmito na salada ou não se deliciou com um incrível coco branquinho e crocante? Palmeiras são importantes para a economia do país. E merecem mesmo todas as homenagens.
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Mas o fogo não é uma das inúmeras plantas que a humanidade em sua história resolveu comer pra ver se era gostosa – o fogo é um fenômeno elementar em todo o universo. E graças àquele Prometeu, amigão do povo, que nos forneceu este conhecimento fundamental para a humanidade (e depois ficou uns 30 mil anos se lascando na picada dos abutres), é que os humanos puderam evoluir, construir cidades e inclusive ferver o palmito, as batatas e todo o resto, pra sopa de todas as noites.
E esta semana, na final da Copa Libertadores, teremos um combate estético e histórico. Mais do que um embate futebolístico, uma mera final de copa, teremos um embate entre universos tão diversos. Sei bem disso, caro leitor. Vi com os meus olhos.
Vivo aqui, em São Paulo, no canto do mundo onde mais palmeirenses se reproduzem. Meu pai mesmo é palmeirense. Minha esposa o era, quando a conheci. Seria o meu caminho natural, não fosse a beleza estonteante e hipnótica do Flamengo e sua torcida. Tornei-me Mengo ao completar seis anos e, desde então, por quatro décadas, tenho vivido entre inimigos: ouço suas palavras, vejo nítida a inveja em suas palavras, em todas as sílabas, o rancor escorrendo na baba mole. Sinto perplexo o quanto lhes dói perder do Mengo e o quanto se excitam na vitória, com doentia fúria.
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Toda essa rivalidade entre Palmeiras e Corinthians é meio que a zanga que irmão tem de irmão. É a briga entre vizinhos, gente próxima que vive a brigar mas se ajeita quando é noite de natal e se encontra na missa de domingo. É aquela raiva de quem se vê demais, se enjoa, gente que discute por causa da marmita, por causa do banco do ônibus, por causa de namorada.
Mas o ressentimento palmeirense em relação ao Flamengo é de outra ordem. É a raiva do xenófobo, aquela aversão sem fronteira e sem alianças, é a raiva que é de inveja e é de juntar cada ponta de suas frustrações numa única seta de lança. Assim, sei bem o quanto a eventual derrota os ferirá, para sempre talvez. Viverão eternamente sem descanso com o olhar bestial daqueles que apenas desejam a vingança.
Quem nasceu para a salada, jamais estará no fogo que constrói e destrói toda a vida. Nesta semana, o Flamengo precisa queimar cada planta que houver, sabendo que na mesma proporção que verá a alegria de sua gente, em maior proporção sentirá o ódio dos derrotados, aquela cólera de consumir e deixar ainda mais feio. Ainda mais.
Orra, é Mengo!
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