O time que nos deu tantas alegrias saiu da euforia para a perplexidade, da perplexidade para a tristeza e daí para a depressão
No final do Fla-Flu, por volta de 40 do segundo tempo, tivemos uma falta na entrada da área. Mesmo com o longo jejum de gols de falta, era uma grande chance de vencer o jogo. A barreira do Fluminense, no entanto, deu dois passos para a frente – a ponto de se descolar escandalosamente do jogador deles que se posicionava atrás da barreira para impedir o chute por baixo.
E ninguém do Flamengo reclamou. Ninguém do Flamengo viu. Diego reclamou depois da cobrança que obviamente bateu na barreira, quando não adiantava mais. Esse lance é o retrato de um time entregue, sem norte, sem alma. Um time que adoeceu.
Esses últimos 5 pontos perdidos, Fortaleza e Flu, revelam um time em depressão. Treinar 10 dias para fazer um gol e depois parar? E não é um bando de vagabundos frouxos, vocês sabem que não. Tem pelo menos 10 em má fase, e os que não estavam, como Gerson e Pedro, estão caindo. No segundo semestre de 1982, lembro como se fosse hoje, Domingo Bosco deu uma entrevista a Kleber Leite e assumiu: “O time está deprimido e um grande time em depressão é pior do que um pequeno time motivado”.
Do mesmo autor: Feliz Dia do Flamenguista (O Álbum)
Vejam que estamos falando do Flamengo mundialista. Um time que emendou sem respirar as conquistas da Libertadores, do terceiro turno do Estadual, do Estadual, de Tóquio e do Campeonato Brasileiro de 1982, um título com sete viradas extenuantes e mais os três jogos finais de altíssima exigência contra o melhor Grêmio de todos os tempos. No dia seguinte à decisão em Porto Alegre, Zico, Junior e Leandro foram para a seleção, os demais ganharam dez dias de folga e aquele Flamengo nunca mais foi o mesmo.
E logo depois da eliminação da Libertadores frente ao Peñarol o Bosco deu o diagnóstico: o time adoeceu. Os três da Copa com a Febre de Sarriá, outros justamente porque não tinham ido para a Copa, todos juntos porque a exigência era muito alta há muito tempo e individualmente, cada um a seu modo, a cabeça dava o comando já duvidoso e as pernas não obedeciam, mente e corpo igualmente desgastados. E nós, torcedores, no calor do momento dizíamos: – O que é isso, desaprenderam?
Não haviam desaprendido. Como os de agora não desaprenderam.
A saída de JJ abriu um buraco muito maior do que a saída de um treinador. E joguem as pedras que quiserem, não havia como impedir a sua saída e também não há motivo para demonizá-lo, nem a ele, nem a Rafinha. É da bola e da vida. E era preciso achar um substituto para o Mister.
O catalão foi um erro compreensível. O Ceni já foi no desespero. E o time, que perdeu seu sistema imunológico com a saída de JJ, começou sua queda. O time foi ficando triste. Me poupem dos comentários “tristes ganhando uma fortuna?” ou “tristes com salário em dia?”. Os adversários também ganham uma fortuna. Assim, à distância, tenho a sensação de que sem o Mister perdemos o treinador genial e a organização em todo o departamento de futebol, mas aí já seria outro texto.
Fato é que o time que nos deu tantas alegrias saiu da euforia para a perplexidade, da perplexidade para a tristeza e daí para a depressão. E assim escrevemos o nosso campeonato brasileiro mais melancólico. Não o pior, não o mais vergonhoso, não o mais sofrido. O mais melancólico. E pouca coisa combina menos com o Flamengo do que a melancolia.