Flamengo campeão da Mercosul 1999: 23 anos do título que desafiou a desordem

21/12/2022, 17:01
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Os mais jovens podem não acreditar, mas já houve um Flamengo que penava para dar alegrias aos seus torcedores. Houve um tempo em que título estadual era a conquista mais palpavel. Ganhar uma Copa do Brasil dependia de grande alinhamento dos astros. Um Brasileiro nem se fala. Já um título internacional era tão raro quanto um eclípse solar total.

E foi justamente isso que aconteceu há exatos 23 anos. Em 20 de dezembro de 1999, o improvável (quase impossível) aconteceu e o Flamengo levantou a sua primeira taça continental desde a Libertadores de 1981. Mais do que isso, o Rubro-Negro desbancou o Palmeiras, então campeão da Libertadores, dentro da casa alviverde.

Ano caótico no Flamengo

E o Flamengo fez isso em um ano marcado pelo caos, desarrumo, brigas internas, demissões bombásticas e etc. Os torcedores que viveram o Flamengo dos anos 1990, principalmente após 1992, sabem que esse era o modus operandi do clube.

Era o Flamengo de Edmundo Santos Silva, eleito em 1998 e até hoje o único mandatário rubro-negro a ter sido impichado pelo Conselho Deliberativo por má gestão. Em 2103, foi condenado a devolver quase R$ 20 milhoes ao clube.

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Mas os problemas do Flamengo haviam começado muito antes de Edmundo. Seis anos antes, na administração Luiz Augusto Veloso, o clube havia se desfeito da melhor safra de jogadores desde a era Zico. Saíram Marcelinho, Djalminha, Júnior Baiano, Marquinhos, Paulo Nunes, entre outros. Todos para rivais nacionais como Palmeiras, Grêmio e São Paulo, que seguiram para conquistar títulos em série.

Depois veio o homem de negócios Kleber Leite, com a sua lábia de ex-repórtter de rádio e discurso mordernizador. Assumiu em 1995 e trouxe ninguém menos do que Romário, o melhor jogador do mundo em 1994 e heroi do tetracampeonato da Seleção. No Flamengo, entre idas e vindas, ganhou um Estadual (1996) e meia Mercosul, como veremos.

Bagunçado, sem dinheiro, mas com camisa. Era o Flamengo do “deixou chegar” na sua melhor essência. Um Flamengo que confiava nos talentos revelados na base misturados com alguns jogadores mais experientes. No comando, o velho Carlinhos Violino, bicampeão brasileiro de 1987 e 1992.

Um Flamengo improvável derruba gigantes

Conhecido pela fala mansa e a incrível capacidade de apaziguar ambientes, Carlinhos tinha validade curta, pois também era comum perder o comando do grupo depois de grandes vitórias. Mas para aquele Flamengo caótico era um nome perfeito.

Campeão Carioca de 1999 com o inesquecível gol de Rodrigo Mendes no Vasco super-campeão Brasileiro e da Libertadores em 1997 e 1998, o Flamengo patinava no segundo semestre. Mal no Brasileiro, o clube convivia com apedrejamento de ônibus e treinos longe do Rio para diminuir a pressão da torcida.

Na Copa Mercosul, o Flamengo caiu no Grupo C, com Olímpia (PAR), Colo Colo (CHI) e Universidad de Chile (CHI). Foram seis jogos, com três vitórias, um empate e duas derrotas, somando 10 pontos. Destaque para as goleadas por 4 a 0 sobre o Colo Colo, em Santiago, mas também o amasso por 7 a 0 sobre a Universidad, no Maracanã. No fim, classificação em segundo lugar.

Vingança no Maracanã e batalha em Montevidéu

Nas quartas de final, o adversário seria o Independiente de Avellaneda, o rei de copas, algoz do Flamengo na Supercopa de 1995, quando levantaram a taça em pleno Maracanã. Quatro anos depois, com Romário em grande fase, o Flamengo empatou em 1 a 1 na Argentina, mas goleou por 4 a 0 no Maracanã, em cinco de novembro.

Era a classificação e a vingança. Era também a despedida de Romário do Flamengo. O baixinho foi demitido em 14 de novembro após promover festa em Caxias do Sul, entre dois jogos do time pelo Brasileiro em solo gaúcho. Dias depois, Romário assinou com o Vasco.

Nas semifinais, outro gigante sul-americano no caminho do Flamengo. O Peñarol, do Uruguai. Algoz rubro-negro na Libertadores 1982, os uruguaios tinham novamente um belo time, mas também as velhas conhecidas garra e violência do Prata.

Na partida de ida, em 25 de novembro, 3 a 0 para o Flamengo no Maracanã, com gols de Leandro Machado, Maurinho e Lê. Para a volta, em nove de dezembro, no estádio Centenário, estava prometida uma batalha. E foi isso que aconteceu, literalmente. O jogo teve de tudo. Cinco gols, arbitragem caseira e, claro, pancadaria no final. A derrota por 3 a 2 garantiu a vaga na final contra o Palmeiras, recém campeão da Libertadores.

Sete minutos de loucura no Maracanã

O ex-jogador Caio Ribeiro, em entrevista ao canal do Zico, definiu em 2019 aquela final contra o Palmeiras. Caio disse: “O Palmeiras tinha um timaço, mas a gente tinha uma molecada subindo cheia de talento e de qualidade. E fomos campeões.”

Foram dois jogos para a história que terminaram com um quase inacreditável placar agregado de 7 a 6 para o Flamengo. Com melhor campanha, o Palmeiras teve o direito de decidir em casa. Por isso, o Rubro-Negro precisava fazer o resultado no Maracanã para ter chance no Parque Antártica.

Em 16 de dezembro, Juan abriu o placar de cabeça para o Flamengo aos cinco minutos do primeiro tempo. Ex-Flamengo, Júnior Baiano empatou aos 44 minutos. No segundo tempo, entrarou para história o período entre os minutos 23 e 28. Nada menos do que quatro gols foram marcados, sendo dois para cada time.

Asprilla colocou o Palmeiras na frente aos 23, mas Caio empatou aos 25. Paulo Nunes marcou o terceiro do alviverde aos 27, mas Caio de novo empatou o jogo aos 28. Depois dessa loucura toda, Reinaldo fez o quarto do Flamengo aos 44. A vantagem era pequena, mas valiosa. Foi assim que o Flamengo foi para São Paulo.

Molecada do Flamengo cala o Parque Antártica

Na volta, em 20 de dezembro de 1999, o Flamengo encontrou um ambiente bastante hostil em São Paulo, além do timaço do Palmeiras, que formou com Marcos, Arce, Júnior Baiano, Cleber, Júnior; Cesar Sampaio, Zinho, Alex; Asprilla, Euller e Paulo Nunes.

Já o Flamengo entrou em campo com Clemer, Maurinho, Célio Silva, Juan, Athirson; Leandro Ávila, Marcelo Rosa, Leo Inácio; Caio Leandro Machado e Reinaldo. A comparaçaõ entre os nomes dos dois times deixa claro como Flamengo precisou se superar para ficar com a taça.

Arce abriu o placar para o Palmeiras aos 20 minutos, mas o Flamengo estava no jogo e Caio empatou aos 46. No segundo tempo, Rodrigo Mendes, que havia substituído Leo Inácio, colocou o Flamengo na frente aos 11. Empurrado pela torcida, o Palmeiras empatou com Arce aos 12 e virou de novo aos 20, com o ex-rubro-negro Paulo Nunes.

A decisão estava seguindo para os pênaltis, mas o Flamengo ainda tinha uma dívida com a sua mística. Encarnando as crônicas de Nelson Rodrigues, a camisa rubro-negra ergueu-se e tornou-se uma bastilha intrasnponível. O Flamengo era agora um adversário imbatível. Coube a Lê, que entrou no lugar de Marcelo Rosa, empatar o jogo aos 38.

O Palmeiras ainda teve sete minutos mais os acréscimos para desempatar novamente, mas a história não permitiu. Cabia ao Flamengo a glória de sair daquele estádio campeão. Apesar de todos os problemas internos, da dívida impagável, dos dirigentes de índole duvidosa, o Flamengo venceu. No fim, prevaleceu a velha máxima flamenga que diz que “deixou chegar, fudeu!”