Flamengo 1 x 0 Grêmio: entendimento e adaptação sem abandono de convicções

18/08/2018, 03:54

A necessidade de se adaptar. De entender as forças do adversário, e achar meios de confrontá-la sem perder suas convicções. É o que pode ser dito do jogo de volta das quartas-de-final da Copa do Brasil 2018, no Maracanã. Tempo e material estiveram disponíveis para que Maurício Barbieri e Renato Gaúcho preparassem suas equipes.

O Flamengo derrapou e perdeu dois jogos no Campeonato Brasileiro, para o próprio Grêmio, com reservas, e o Cruzeiro, no jogo de ida da Libertadores da América. Já o Grêmio vinha embalado, com bons resultados adquiridos por seus reservas no Campeonato Brasileiro e na derrota para Estudiantes fora-de-casa por 2 a 1.

Ambos reconhecidos pelo futebol ofensivo, resolvem pôr em xeque suas próprias propostas. O Flamengo entra em campo com a mesma escalação da primeira partida, com a única diferença residindo em Henrique Dourado no comando de ataque e Vitinho pela ala/ponta-esquerda do 4-1-4-1. O Grêmio, por outro lado, procura maior segurança à frente de sua defesa e promove a entrada do volante Jailson e do lateral-esquerdo Cortez em seu 4-2-3-1.

Mas seria mesmo o Flamengo no usual 4-1-4-1? Buscando impôr seu jogo funcional presente na figura e movimentação de seus armadores, para assim envolver o sistema defensivo dos visitantes e alcançar a classificação? Claro... que não. Barbieri adapta o que já utilizou ao longo da temporada na tentativa de tirar o Grêmio, tão respeitado, de sua zona de conforto.

Como apresentado nos campinhos acima, o Flamengo entra em campo em um 4-4-2 funcional próximo ao apresentado na partida contra o Sport, com a postura como o diferencial daquela partida: defende a altura média, laterais mais travados e focados em marcar, encurtando os espaços ao flutuar os jogadores para o lado em que a bola estivesse, povoando o setor. O Grêmio, portanto, usa Maicon, responsável por ditar o ritmo do meio-campo, como isca para a pressão alta, enquanto inverte o jogo para a dobradinha de Cortez-Everton pela esquerda e Ramiro-Leo Moura pela direita como alternativas de profundidade.

Everton Cebolinha que, antes de esgotar suas forças na Arena do Grêmio e ser substituído, foi ponto de desafogo e referência para jogo acelerado da equipe gremista. Sempre na habilidade individual, desafiou a marcação individual simples com dribles (êxito em 7 de 10 tentativas), diagonais ou viradas de jogo. Aqui, em uma versão mais segura de Rodinei, recebe auxilio constante de Paquetá e Éverton Ribeiro ao fecharem um triângulo de marcação na lateral, com Léo Duarte sempre atento para a cobertura. Mais firmes do que o jogo anterior, Everton sofre com os duelos físicos impostos pelos três, induzindo-o à linha de fundo. Cortez, em noite não tão inspirada, se torna apenas um espectador das dificuldades sofridas por seu companheiro.

Pela esquerda flamenga, Renê resistia ao ímpeto ofensivo do trio Léo Moura-Ramiro-Luan. Diego e Vitinho, de bom porte físico e grande voluntariedade, não conseguem retomar a bola ou pressionar o portador com a frequência necessária, muitas vezes sendo superados e sobrecarregando o lateral-esquerdo e Cuéllar em noite mais intensa que o comum. O tricolor gaúcho ao preparar-se para um jogo mais reativo com Cortez e Jaílson, teve dificuldade de impôr-se com efetividade ao longo do 1° tempo, sobretudo após o gol de Éverton Ribeiro aos 5’ em erro de rebatida de Cortez.

Se nos primeiros instantes da partida ambas as equipes trouxeram perigo a partir de contra-ataques originados de rebotes de cobranças de falta e escanteios, agora cabia ao Grêmio assumir as rédeas da partida e correr atrás do empate. Ao Flamengo, manter-se em sua proposta de ocupar espaços e agredir na saída de bola e no pós-perda. Nesse quesito, a equipe mostrou deficiências.

Réver, zagueiro veterano e de grande estatura, possui boa leitura de jogo, mas tem dificuldade de antecipar-se a opção de passe com o vigor necessário, além de manter a linha de defensores mais recuada do que deveria, abrindo um clarão entrelinhas que deveria ser coberto por Cuéllar e seu companheiro de zaga. Grêmio poderia não ter Cícero em campo, mas possui Geromel, e o zagueiro de Copa do Mundo merece um capítulo à parte. Detentor de ótimos recursos, antecipa, desarma, intercepta, cria e aparece para finalizar. Lê as linhas de marcação adversária e reage sob pressão com muita naturalidade. Ao lado de Maicon, orquestrou com sabedoria a saída gremista, encontrando Luan e Everton flutuando às costas de Cuéllar, muitas vezes atraído para longe da zona central, causando certa instabilidade na marcação.

Entretanto, a falta de criatividade e precisão gremista inibiu um número de finalizações contundente. 69% de posse de bola, mas apenas 6 chutes e só 1 na meta de Diego Alves. Construíram jogadas similares ao gol de Luan no jogo de ida, mas sem sua inspiração ou intuição para posicionar dentro da área e finalizar com qualidade. Para o outro lado, Diego retinha bola e cadenciava o jogo a favor dos donos da casa (principalmente no 2° tempo, quando foi adiantado e liberado de obrigações defensivas para pausar o jogo). Ainda possui dificuldade de imprimir intensidade no jogo vertical (em três tentativas de jogada mais acelerada, dois passes equivocados e uma ótima assistência para Paquetá que cai dentro da área, mas o juiz nada marca) e ser decisivo, mas é sempre escolha segura para manter o controle e ritmo da partida (nenhuma perda de posse ao longo dos 90’). Ao lado de Dourado (atuação discreta), tinha não só a função de preparar a transição ofensiva como pressionar os volantes. Com tudo em tudo, não comprometeram e proveram o necessário para não sofrer grandes perigos.

Vitinho, grande contratação rubro-negra para o restante do ano, ainda está em período de adaptação e entrosamento, e em proposta reativa, foi colocado como condutor para a transição ofensiva e puxada de contra-ataques. Porém, uma de suas qualidades se apresentaram como fraqueza na partida: chutar a qualquer oportunidade. Preferiu finalizar a construir com mais cuidado a oportunidade.

Para o 2° tempo, uma adaptação imediata: Paquetá agora fecha como um externo pela direita enquanto Everton Ribeiro centraliza ao lado de Cuéllar. Objetivo claro: aumentar a pressão e fisicalidade do 1° combate, para assim mitigar as forças gremistas na saída pelas laterais, evitando que a bola chegue em condições favoráveis para Everton Cebolinha. E tais compensações são uma das maiores forças desse Flamengo, seja no ataque ou na defesa: a movimentação mais natural, menos ordenada dos jogadores, mas comprometida. Se Vitinho persegue o portador, outro assume o espaço para evitar brechas nas linhas. Vale citar o esforço de Diego em tentar manter Maicon sempre pressionado na saída. Infelizmente, é necessário se manter essa intensidade por mais tempo, o que é demais para o seu físico e de Dourado, o que faz com que Grêmio consiga predominância no território do adversário – em 3 minutos, duas entradas perigosas dentro da área rubro-negra em bicicleta de Ramiro e em cruzamento rasteiro rente à pequena área interceptado por Rodinei.

E nesse ponto, há de se destacar Paquetá e Everton Ribeiro. Juntos contabilizaram 21 de 39 duelos(!) e 6 desarmes, contra apenas 9 de 21 duelos e 2 desarmes por Luan-Maicon-Jailson. Essas pequenas vitórias são fundamentais para evitar um esmagamento da equipe gremista sobre o Flamengo e consequentemente seu cansaço. Lucas Paquetá vem se firmando na temporada como uma fortaleza física no meio-campo, com força pra combater laterais, voltar em auxílio a Rodinei até a linha de fundo e puxar contra-ataques. Erra e exagera como todo jovem. Amadurecerá com seus erros. Mas é inegável sua importância. Já Everton Ribeiro é a mente criativa, jogador de gestos técnicos polidos seja ao atrair a marcação ou ao suporta-la enquanto busca linhas de passe para desmonta-la, com sua inteligência e versatilidade. Não só o autor do gol como o melhor em campo.

Com o desgaste e a pressão psicológica sobre o Grêmio, erros técnicos se tornaram frequentes e a equipe perdeu muito do ímpeto. Faltava ao Flamengo aproveitar a deixa. E Barbieri leu a situação e promoveu a entrada de Marlos Moreno no lugar do desgastado Vitinho. O colombiano agrega em jogada individual, velocidade e profundidade na transição ofensiva contra um já combalido meio-campo gremista. 1 chute no gol, 6 de 9 duelos, 3 faltas sofridas e 2 de 3 dribles completados, conquistados em seus 33 minutos em campo. Através de Diego proteger a bola e conquista-la em disputas por baixo, Paquetá como referência para o combate aéreo – no que se destaca cada vez mais, sendo uma força a ser reconhecida pelo alto - e carregando o meio-campo no braço, criatividade de Everton Ribeiro e explosão de Marlos, o Flamengo equilibra a partida.

Mas não se poderia terminar a analise sem citar individualmente Gustavo Cuéllar. Volante colombiano que até aqui vem sendo o melhor jogador da temporada, sustenta a proteção à ultima linha por si. Com o adiantamento de Paquetá e a liberdade conferida a Diego para se postar mais à frente, era seu dever ocupar todo o espaço entrelinhas para evitar falhas na estrutura, no melhor exemplo de “para-brisa” possível. O que justifica seu baixo índice de desarmes na partida. Sua função não era o combate em si, mas duplicar a marcação em todos os setores em que a bola estivesse. Tarefa hercúlea que o desgastou ao limite. Aos 85’, sofreu de fortes caibras e teve de ser substituído. Um gigante enquanto esteve em campo.

Ao fim, uma classificação mais do que merecida de uma equipe que soube jogar seu futebol em território historicamente hostil e soube adaptar-se ao adversário quando deveria. Falta intensidade e recursos defensivos de pressão e retomada da bola, mas sobrou voluntariedade e inteligência tática na sua movimentação ofensiva e defensiva. Que chegue as semifinais, em mais um grande desafio da temporada. Seguimos vivos e em busca do título.
 


Matheus Miranda analisa os jogos do Mengão no MRN. Siga-o no Twitter: @Nicenerd04

Imagem destacada nos posts e nas redes sociais: Gilvan de Souza / Flamengo

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