Reunião com Claudio Pracownik - Vice-Presidente de administração do Flamengo
Flávio H. Souza | Twitter: @PedradaRN
“O Flamengo progressivamente vai encontrar o seu destino.”
No dia 29 de abril de 2015, me reuni com Claudio Pracownik em seu amplo escritório em Botafogo. Já comecei elogiando o nome da sala em que iríamos nos encontrar, chamada “Flamengo”. Ele disse que quando chegou lá, a sala tinha o nome de “Praia do Botafogo”. E ele mandou alterar o nome para Flamengo, a despeito de já ter outra sala com nome Flamengo contígua a esta. Os funcionários estranharam e pediram para que uma fosse Flamengo A e a outra Flamengo B. Ele então disse aos funcionários que não existia Flamengo A e Flamengo B. Tudo é Flamengo. Indivisível. Depois fez uma obra em que ao se abrir um painel as duas salas se tornam uma só, a qual apelidou de sala “Mengão”.
E foi com este espírito que começou minha entrevista com o grande rubro-negro Claudio Pracownik.
MRN: Primeiro de tudo, como se tornou Flamengo?
Pracownik: Me tornei Flamengo no dia em que nasci. É uma bagagem genética que você carrega dos seus pais...Esta carga genética evidentemente é uma brincadeira, mas a formação cultural te leva a isto. Normalmente suas referências são seus pais e eu tenho o caso de um irmão mais velho também. Meu pai era um rubro-negro doente, de carteirinha, assim como meu irmão, que são os homens mais importantes na minha criação. Desde os meus 6 anos de idade me levavam aos estádios.
A verdade é que o futebol desempenha na vida das pessoas um papel muito importante como um canal de liberação de angústias, de tensão, aonde você projeta muita coisa. O Ser Humano precisa ter um “objeto de transferência”, você transfere coisas boas, coisas ruins. Tem muita gente que transfere isto, e aí não vai nenhum julgamento religioso, leva isto para a religião. Projeta isto na religião. Procura explicações lá. É..eu sou judeu né? E a minha formação judaica é muito de questionar as coisas, muito de investigar, ficar sempre questionando. No judaísmo não encontrei esta referência mágica. Encontrei outras referências. Encontrei esta visão “mágica” do mundo, a explicação “mágica” do mundo, no Flamengo. Então se as coisas boas aconteciam, aconteciam por causa do Flamengo. Se acontecia algum coisa ruim, esta acontecia para prejudicar o Flamengo. Então o Flamengo foi a mágica na minha vida. O objeto mágico o qual me apeguei desde cedo, para ter explicação para as coisas boas e ruins. Então tudo tinha uma relação com o Flamengo. E assim é até hoje.
MRN: Qual o jogo que mais lhe marcou?
Pracownik: O jogo que mais me marcou, de todos, foi o gol de cabeça do Rondinelli. (https://www.youtube.com/watch?v=xZI3yotmnyM). Não fui na final, meu irmão não quis me levar, disse que era um jogo perigoso, era à noite. Mas fiquei lá no radinho e na hora do gol dele…(silêncio) foi uma emoção tão gigante que tenho impressão que desmaiei naquele dia...
MRN: E foi o gol “mito”. Porque este gol viabilizou a continuidade daquela equipe…
Pracownik: É. Dali começou uma história de conquistas do Flamengo. E aí depois eu comecei a acompanhar muito de perto. Estive nas coisas boas e nas coisas ruins. Disputas de pênalti que o Flamengo perdeu, o Flamengo ganhou. Eu acompanhei todos os títulos à partir daí. Mas eu me lembro que neste dia saí com meu pai para comemorar na rua de noite, uma comemoração maravilhosa, espetacular. Um dia muito emocionante na minha vida. À partir daí me tornei muito mais assíduo. Ia de ônibus, de arquibancada...fui de geral várias vezes, mas sempre ia. Ia sozinho...ia acompanhado. Eu ia! Não deixava de ir em hipótese alguma. Até o momento em que tive um crescimento profissional e aí adquiri, o que considero o bem patrimonial mais importante da minha vida, aquelas cadeiras especiais do Maracanã. Eu nunca tive tanto prazer na minha vida em adquirir um bem. Um carro, uma viagem pro exterior, uma joia para sua esposa, primeiro apartamento que você compra...Nada me deu mais prazer que comprar uma cadeira especial no Maracanã, nada! Foi um acontecimento, uma realização imensa em minha vida.
MRN: E continua com elas lá…
Pracownik: Lógico! Quando empresto minhas cadeiras, empresto com a obrigação de me devolver no mesmo dia! É lógico que instituíram o cartão magnético, mas sempre falo às pessoas quando empresto: “Este é o bem patrimonial mais valioso da minha vida”. Nada me deu mais prazer, foi uma conquista única na minha vida. Tenho orgulho enorme.
Hoje em dia não vou mais de cadeira porque desde que me tornei dirigente de novo...Estou na segunda passagem pelo Flamengo... Infelizmente a gente tem que andar de segurança no Maracanã. Mas...as cadeiras estão lá. Queria poder recuperar a liberdade de poder ir de cadeira de novo. Poder desabafar...Hoje em dia a gente não pode nem desabafar. Não pode xingar, não pode reclamar do time...
MRN: Tem que ficar imóvel…
Pracownik: Tem que ficar imóvel ali. Eu fico desesperado, quem me conhece sabe como vejo os jogos. Fico muito nervoso. Os seguranças voltem e meia tem que trazer água...Eu vou sempre com Rivotril na mão, minha camisa do Flamengo não tem meu nome está escrita “Rivotril” atrás (risos). Eu vou com Rivotril na mão como se fosse um santinho, fico beijando o Rivotril (risos) ...Já parei no ambulatório do Maracanã umas três vezes. Fico muito nervoso.
MRN: Faz como eu, xingo para caramba…
Pracownik: Não consigo, vou mantendo para dentro a história toda. Fico meio introspectivo. Coloco para dentro a minha angústia. Fico mudo. Vou ficando em um grau de nervosismo, que quando o Flamengo faz um gol...Olha, já desmaiei de alegria. No hexacampeonato eu desmaiei. Estava no camarote, caí. Flamengo fez quatro gols no Fluminense, devolvendo uma goleada, eu desmaiei. E já desmaiei em momentos ruins também. Lembro do gol do Assis. Então, fico muito nervoso, efetivamente.
MRN: Para quem não lhe conhece, quem é Claudio Pracownik, o que faz da vida, e o que faz na vida de nós todos no Flamengo?
Pracownik: Me defino como...é curioso...quando você entra no meu twitter, no meu instagram e tal, ou quando faço palestras, sempre falo “sou judeu, advogado, trabalho no mercado financeiro, flamenguista, canhoto e daltônico. Se alguém tiver algum tipo de preconceito pode se levantar e ir embora.” Então é difícil ter amigos quando você normalmente é culpado...Quer dizer, normalmente a culpa é dos advogados, os antissemitas dizem que a culpa é dos judeus, tem os caras que odeiam os rubro-negros. Vencer, tendo todas estas qualidades...para mim todas elas são qualidades, não é fácil. Fazer amigos e tudo o mais. Mas sou uma pessoa de bem com a vida, sigo minha máxima de buscar felicidade o tempo inteiro. Sei que a vida não é simples para ninguém, mas sou um cara que sigo muito meus desejos, os meus sonhos. Mesmo que você nunca os realize, a felicidade não está exatamente na realização dos seus sonhos, e sim a felicidade está em buscar os sonhos. Então, sigo sonhando…
MRN: E a VP de Administração? O que ela é e o que foi realizado nestes dois anos e meio?
Pracownik: Minha vida profissional inteira...aqui (Brasil Plural) eu sou COO (Chief Operating Officer). No Setor de Operações. Assim eu fui a vida inteira. Responsável pelo “BackOffice”, como se chama. Tudo que não é centro de receita, tudo que é centro de custo. No banco, por exemplo, isto é RH, Jurídico...sou advogado de formação, TI, liquidação, controladoria, contabilidade, área de risco, área de crédito, parte administrativa, recepção, compliance, área de custódia...tudo que dá suporte a uma atividade-fim é o que faço. Isto é um traço característico de minha personalidade e de minha vida profissional. Sou um cara que...apoio. Evito superexposição, eu trabalho para que as pessoas tenham suas exposições, faço o trabalho dos bastidores. É o que faço a vida inteira. Faço negociações contratuais, faço todas as negociações que levam a uma conclusão de um negócio. A VP de Administração nada mais é do que isto. É o trabalho dos bastidores. Isto no Flamengo significa cuidar do RH...durante muito tempo significava cuidar da área de TI, a gente separou agora, almoxarifado, compras, viagens, recepção, segurança. Que é algo que me dá muita preocupação, a parte da segurança patrimonial e segurança física das pessoas que estão no Flamengo. Então é o trabalho dos bastidores. Faço o suporte para que as coisas aconteçam.
A VP de Administração é também responsável pela manutenção do CT, por exemplo. A manutenção dos campos: campo da Gávea, campo do CT passa por mim...Na verdade passa por minha equipe. A nossa gestão prega e pratica o profissionalismo. Daí a delegação aos profissionais. Ficamos com as macro-tarefas, fazemos o controle, a fiscalização, cobramos e determinamos mudanças de rumo, principalmente as mudanças de prioridade. Se o Flamengo tivesse dinheiro para tudo era fácil fazer tudo. Como não tem dinheiro, a tarefa mais difícil para nosso grupo é sempre a alocação de prioridades. Onde vai este dinheiro? Tentamos nos manter sabendo que o futebol é o carro-chefe dos 40 milhões de apaixonados que a gente tem, mas cientes que não basta. Mantemos associados no clube, temos sócios, temos sócios-torcedores, todos stakeholders...os fornecedores, os esportes olímpicos, o remo que são fundamentais no clube. A gente tem que deixar todo mundo contente, é uma obrigação nossa. E você tem que saber alocar sua prioridade. Não adianta trazer só jogadores e deixar o clube...sujo. Você não pode deixar de investir no esporte olímpico, nas quadras de tênis...tem que estar cuidando do clube como um todo. Então o meu trabalho é este, de dar suporte para as pessoas e muita das negociações que acontecem, não dos jogadores exatamente, embora tenha me envolvido com um e outro, mas os trabalhos de negociação com os fornecedores, contratos muitas vezes relacionados com o marketing e com o patrimônio, muitas vezes passam pelo meu apoio tendo em vista minha experiência com este tipo de coisa, embora não necessariamente façam parte da minha vice-presidência. Mas eu vejo como um grupo então sempre que um pode colaborar em alguma coisa, a gente colabora. Na contratação do Luxemburgo, por exemplo, eu participei. Não tinha nada a ver com o futebol. Mas nós somos um grupo, né? E este conversar...perguntaram “Quem pode ir conversar com ele em São Paulo?” Eu disse: “Estou em São Paulo, posso ir”. E fui. Então, a gente trabalha muito de maneira anônima, buscando a eficiência, buscando não fazer barulho ou o mínimo de barulho possível...para que as coisas aconteçam. Flamengo quanto mais barulho, menos foco se tem. Flamengo tem um problema de falta de foco. Se deixar guiar pelo o que as pessoas berram, pelas demandas das redes sociais que mudam cada dia…
MRN: E o humor ainda varia com vitória ou derrota, não é? ...
Pracownik: Varia! ...tem que se manter focado. E o papel de nossa administração é manter este foco.
MRN: Na campanha você fez brilhantes apresentações, concedeu ótimas entrevistas e depois da eleição, inexplicavelmente, não apareceu mais. Queria saber mais o porquê disso.
Pracownik: Não é meu papel. Quando é necessário em momentos como este, nesta entrevista, ou em outras entrevistas, quando em campanha, ou quando tenho que falar com meus funcionários aí exerço meu papel. Mas no Flamengo gosto de pensar que nós somos uns abnegados anônimos. Ninguém gosta muito de aparecer. Algumas pessoas têm que aparecer mesmo que elas não gostem...O Eduardo (Bandeira de Mello) é a nossa cara. Então ele tem que aparecer. Nenhum de nós tem que aparecer mais do que o Eduardo. Quem tem que aparecer é o Eduardo, faz parte do “job description” dele. Não é do meu “job description” aparecer. Isto é uma coisa que acho que subverteu um pouco a ordem do Flamengo. Me lembro que quando a gente assumiu vários repórteres ligavam para mim e diziam: “Claudio, queremos saber tais informações…”. Eu dizia: “Não posso prestar este tipo de informação”. “Mas se você prestar este tipo de informação você fica próximo, quem sabe a gente tira uma foto…”. Eu dizia que não tinha o menor interesse. Meu interesse em matérias jornalísticas tem a ver com a minha empresa. A minha empresa aparecer no jornal me interessa, eu aparecer no jornal pelo Flamengo não me interessa. Não quero. Nós somos abnegados anônimos. O Wrobel tem que aparecer, não tem como. Em alguns momentos ele tem que aparecer. Em entrevistas coletivas ele tem que falar. Faz parte do “job description” dele. Em algum momento o Flávio (Willeman) terá que falar quando for assunto jurídico. Agora, porque que irei falar sobre qualquer um destes assuntos? Um dia fui convidado para uma palestra, dei a palestra, e falei...então, são propósitos diferentes eu não tenho nenhuma vaidade de aparecer. Quando é necessário a comunicação, por questões políticas na Gávea, como eu sou uma pessoa antiga na Gávea, posso não ser muito, mas dentro do grupo sou dos mais antigos. Já fui vice-presidente anteriormente, sou conselheiro do Flamengo desde 95. Então sou destacado para conversar, fazer encontros políticos, buscar negociações internas...e sempre que possível de maneira anônima, buscando o bem do Flamengo. Eu faço bem a mim quando faço bem ao Flamengo. Ponto. Esta é a única vaidade que tenho, é ver o Flamengo bem. É só isto que me interessa. Acho que isto responde um pouco a sua pergunta sobre a minha pouca ou redução da minha aparição.
MRN: Na sua VP de Administração, você está com um grupo que implementou novos paradigmas na Gávea, novos processos, e isto fez com que todos sentissem a diferença, não só associados como os próprios funcionários do clube. Então, as dificuldades encontradas foram muito maiores que o esperado, inclusive em termos de processos no BackOffice?
Pracownik: Sem dúvida. Flamengo não tinha nenhum processo no BackOffice. Zero processo. E zero descrição de cargos e processos.
MRN: E hoje já tem isto?
Pracownik: Hoje em dia a gente já tem isto. Os processos eram descentralizados. Pega o RH por exemplo, cada área contratava quem queria. Se os esportes olímpicos tinham que contratar um gerente, contratava. E decidia o salário e informava ao RH. Se Segurança quisesse contratar, também contratava e definia o salário. Se a área de Patrimônio quisesse contratar um arquiteto novo, contratava.
MRN: Não tinha qualquer controle de orçamento?
Pracownik: Não tinha controle de orçamento nem...muito menos uma centralização destas demandas. O correto é, se você tem uma necessidade primeiro tem que buscar se existe este recurso dentro da Gávea para suprir esta necessidade. E até dar chance de realocações internas para motivar os funcionários. Segundo, tem que ter uma área de RH que saiba descrever o perfil do profissional, para procurar, para entrevistar, para buscar certidões, ver se esta pessoa é capaz de trabalhar para a função que foi determinada, se ele é simplesmente indicado por alguém, se é amigo de alguém, ou se existe à partir daí algum interesse político. Se você tem uma vaga, você tem que saber qual é a descrição da vaga para buscar um profissional que atenda esta vaga. É o RH que busca e define o salário. Ela faz a seleção, entrega para as áreas hoje em dia entrevistarem, eles escolhem entre os candidatos indicados pelo RH quem deve entrar. Ponto. Isto é o básico.
MRN: Então teve a implantação do RH no Flamengo?
Pracownik: Lógico. A gente, infelizmente, ainda fez pouco pelo RH, eu acho. O que a gente gastou tempo e investiu neste período na área de Recursos Humanos, por exemplo, foi na organização da casa. Os processos...não só os de contratação, os processos de demissão por exemplo. E documentação relativa a demissão. Não existia. Você tinha que procurar uma guia paga, você não achava.
MRN: E no início deve ter sido muito estressante…
Pracownik: Muito. Ainda é! A gente continua procurando documentações antigas. Esta parte de arquivo, documentação de funcionário, descrição de histórico, é um trabalho gigantesco que tem que ser feito. E tudo isto feito sem aumentar o número de funcionários dentro do clube. Ao contrário. Então, dentro da área de Recursos Humanos, o trabalho foi muito bem feito na área de DP (Departamento Pessoal), que hoje em dia está organizado, você consegue contratar, demitir, aumentar, aplicar os dissídios, negociar com Sindicatos, de maneira organizada e documentada. Do que na área propriamente de treinamentos, desenvolvimento, busca de potenciais dos funcionários da Gávea. Este trabalho tem que ser feito ainda.
Mas é aquilo que falei das prioridades. Nossa primeira prioridade, antes de investir no treinamento, é arrumar a casa.
MRN: Organizar o caos…
Pracownik: A gente está organizando o caos. E agora a gente começa a poder pensar numa área de RH típica, com as outras funções relativas a área de RH. Isto é um exemplo. Você pensa na área de Compras do Flamengo, era a mesma coisa. Não existiam processos relativos a licitação que fossem escritos e definidos, os arquivos da documentação sobre as licitações...a gente unificou, por exemplo, os almoxarifados. Eram vários almoxarifados, cada área cuidava de seu almoxarifado. A gente unificou, existe um controle documental. Existe um sistema que controla isto. Quem busca, quem retirou, o que retirou e para que. Tem uma autorização para isto.
MRN: Antes não tinha nada disso?
Pracownik: Tinha muito pouco e de forma pouco eficiente. Por outro lado a gente agilizou outras coisas. O Flamengo tinha a cultura da CI (Circular de Informação ou de Requisição, para controle Interno). E era engraçado. Se o cara quisesse pedir qualquer coisa ou qualquer autorização...um vice-presidente tinha 80 requisições para assinar por dia! “Solicito a entrega dos documentos tais...recebi os documentos tais…” Falei: “gente, estamos colocando um modo de profissionalização que os diretores têm que fazer, não precisa passar por vice-presidente”. No entanto, existem obrigações estatutárias que precisam do “Ok” do vice-presidente. Falei:” Porque não podemos utilizar o e-mail para escrever: ‘Ok’?” Aí falaram que “Não, isto não pode…” “Onde está escrito que isto não pode, usar e-mail para dar Ok?” “Não, os regulamentos internos dizem…” “Me acha!” ..”Ah, não achamos mas é uma prática…” falei: “Vamos, à partir de agora, autorizar por e-mail.”. Aí levamos isto aos poderes, aos conselhos...” Não, talvez devesse fazer um manual da regulamentação de como se dar Ok…” Eu falei: “Gente, se dá ok no e-mail se dando ok, ok? À partir de agora é assim. Eu vou mandar por e-mail, eu vou responder por e-mail, eu vou arquivar o e-mail e vamos dar Ok”. É uma história inacreditável, mas verdadeira!
É lógico que algumas coisas têm que ser por escrito. Requisição aos poderes, questões orçamentárias, existem certas coisas que você precisa ter o documento formal escrito até devido a formalização de comissões, fiscalização de órgãos externos ou órgãos internos como é o Conselho Fiscal. Mas no Flamengo não existia uma dinâmica nem do “ok”. Se o vice-presidente viajasse, e isto acontecia muito no Flamengo, aconteceu no meu primeiro mandato, o cara viajava, ficava uma quantidade de coisas paradas para esperar o vice-presidente voltar. Eu estou viajando? Eu dou ok pelo meu iphone!. “OK”! Eu não paro de trabalhar pelo Flamengo quando estou de férias. Eu dou ok. Decidir viagens, compras, é só dar Ok. Por incrível que pareça isto foi uma mudança no Flamengo. Então, ao mesmo tempo que a gente formalizou os procedimentos, os processos, por outro lado a gente desburocratizou a dinâmica destes processos. Acho que a gente fez um belo trabalho neste campo da administração.
No começo quando a área de TI estava junto com a área administrativa e também agora na gestão do Pedro (Almeida), excelente vice-presidente...o Flamengo avançou muito na área de informática. As pessoas não veem. Mas toda a parte de segurança da informação, e-mail e proteção de dados, o Flamengo era...inacreditável. Quer dizer, não havia nenhuma segurança nos e-mails. Qualquer cara que quisesse invadir, qualquer estagiário, invadia o Flamengo. Imediatamente. Os e-mails estavam à disposição de qualquer pessoa.
MRN: Isto devia facilitar diversos vazamentos para imprensa…
Pracownik: Muitos vazamentos devem ter acontecido por causa disso. Era muito fácil invadir. Era muito fácil copiar dados no Flamengo. Não havia backup de muitas coisas. O backup ficava dentro da Gávea, o Backup é fora. Servidor de e-mails fica fora. O PABX hoje em dia, é um PABX virtual do Flamengo. O PABX antigo do Flamengo quando dava problema não tinha nem peça para trocar. Então, modernizou muito. Ainda falta no campo da gestão que a gente consiga criar um sistema de Business Inteligence dentro do Flamengo. Um Sistema de Administração, como o SAP por exemplo, ou coisa semelhante. Mas, mais uma vez...vai se chegar lá. Não se “pula” para o SAP. Primeiro se passa a ter processos dentro destas áreas.
MRN: Primeiro precisa dos processos definidos para depois trazer o SAP
Pracownik: Pois é! Como é que você traz o SAP mas você não tem pessoal para ser treinado nem processos? Não adianta. Não funciona. Um Business Inteligence, pode ter Inteligence mas não vai ter o Business...O que a gente fez nesta área, e o Pedro continua fazendo, é uma bela revolução dentro do campo de TI e Telecomunicação. Ainda há reduções enormes de custos. Nós reduzimos muito o custo de telecomunicações renegociando com os parceiros tecnológicos através de patrocínio e através da credibilidade que a gente conseguiu pagando em dia as contas. Então, houve uma... “revolução silenciosa” na administração do Flamengo. Ainda tem muito o que se fazer. Mas quem vive o dia-a-dia sabe que a administração do Flamengo mudou muito.
MRN: Bom saber disso...quando não há muitas reclamações é porque as coisas estão sendo feitas…
Pracownik: Exato! Sabe como é o mundo de futebol? Qualquer coisa do Flamengo vira notícia. Banheiro da Gávea vai para página do Globo.com. Eu fui do Fla-Gávea do Flamengo no início. Acumulei um monte de vice-presidências. Secretaria, Fla-Gávea, TI, Administração e..teve uma vez que morreu um tenista. Jogando meio-dia, sol a pino jogando tênis lá, e lamentavelmente o associado morreu. Fui lá ver o que tinha acontecido, prestar solidariedade à família, aos sócios, para ver se podia ajudar em alguma coisa. Cheguei lá, e um bando de repórteres, tirando fotos...falei: “Gente, infelizmente morreu um sócio…”. Parecia que estava apresentando um atleta. Qualquer coisa vira notícia. Estacionamento do Flamengo, foi uma das coisas que a gente fez, foi na minha vice-presidência, na minha administração, que foi a terceirização do estacionamento da Gávea, apareceu na primeira página do Globo.com! E que estacionamento do mundo virou página de qualquer site jornalístico?! Só o estacionamento do Flamengo!
MRN: Isto era interesse público zero, somente de interesse do associado.
Pracownik: Matérias no Globo.com, matérias no Lance, no Globo escrito, nos blogs...estacionamento do Flamengo!
MRN: Achei importante porque mostrou uma iniciativa administrativa que mesmo sendo, ao menos na época, impopular em vários setores do clube, vocês bancaram.
Pracownik: Bancamos
MRN: Bancaram, remodelaram. Ficou um estacionamento muito superior ao que tinha antes.
Pracownik: Pois é. E com seguro! E hoje em dia tem vaga.
MRN: Eu ia lá, por vezes, terça-feira à noite e já não tinha vaga nenhuma. Parecia que o Flamengo estava cheio de associados dentro, mas não tinha ninguém. Tudo nos condomínios no entorno e empresas...
Pracownik: Exatamente, e amigos que paravam ali…
MRN: Acho que aparecer na imprensa teve o seu lado educativo tanto para dentro do Flamengo como para fora.
Pracownik: Foi uma luta. Além de tudo, o Flamengo naquele momento que a gente assumiu estava com um gigante déficit financeiro ...relembrando. Primeiro dia de nossa gestão fomos contar dinheiro. O que tem para pagar este ano e o que tem para receber. Não era gerencial ou patrimonial, era caixa e obrigações. Soma tudo. Vamos lá, até final do ano quanto sobra de caixa? Menos 100 milhões! É isto que a gente começou o ano. Menos 100 milhões no caixa. E aí a gente tinha que poder arrecadar para manter o clube andando, não é? E então, o que (o estacionamento) nos deu de luvas foi importantíssimo para o Flamengo sobreviver. Sabe? Foi muito importante. Além de todos os benefícios. Eu tive que fazer a exposição no Conselho, foi uma confusão na assembleia, não era um assunto pro Conselho Deliberativo mas nós levamos porque virou uma confusão e teve repercussão. Quando fui falar lá, vaiaram, pessoal xingando, terminou todo mundo aplaudindo. Todo mundo compreendeu. Com a comunicação. Nós erramos muito na comunicação também, eu acho. Estávamos tão atarefados em fazer, botar o clube de pé, sobrevivendo, ali na CTI, e a gente acha que errou muito nesta questão. Devíamos ter investido mais tempo comunicando melhor. A gente aprendeu esta lição. Principalmente no primeiro ano. Acho que estamos melhorando muito esta parte de comunicação nossa, né? Com os stakeholders. Mas o estacionamento foi uma luta...impressionante.
MRN: Que cargo já exerceu no Flamengo? Como foi na época?
Pracownik: Foi a época do impeachment do Edmundo (Santos Silva), pós-impeachment...quem assumiu foi o Hélio Ferraz, já conhecia o Hélio do mercado. Sempre trabalhei em bancos, tinha relações com o mercado que acabaram virando relações amistosas. E, quando ele assumiu, eu participei do processo ali, eu já era conselheiro. Ele me convidou para ser vice-presidente de Planejamento. Cuidar do orçamento do clube. E como já falei em entrevistas…” Flamengo não pede, Flamengo convoca”. Naquela época estava administrando algumas empresas, pedi licença, até tinha um escritório de advocacia naquela época, tinha saído do mercado financeiro. Pedi licença aos meus sócios e falei: “Olha, recebi uma convocação mais forte. Tenho que ir. Eu não recuso a convocação.” E fui né? Flamengo estava numa situação financeira caótica, pior do que se poderia imaginar. Naquela época a situação política ainda era muito pior. Flamengo estava muito mal nas pernas. Situação de caos administrativo, político e financeiro. Nunca esteve bem nas pernas, não estava bem naquela época também.
MRN: Mas o Hélio Ferraz não tinha a intenção de montar, que nem hoje, um Conselho para decidir as coisas?
Pracownik: O Hélio era um cara que ouvia muito as pessoas. Uma coisa que não se pode dizer do Hélio é que não seja democrata. Trabalhava ouvindo as pessoas, mas tomava decisões presidencialistas. O Hélio exerceu o presidencialismo dentro do clube. Mas é um cara que sempre ouvia muito as pessoas, me ouvia muito. Ouvia os outros vice-presidentes também. Ele sempre se cercou de pessoas. Em determinado momento eu estava lá cuidando do orçamento, tentando entender o orçamento do clube que era uma loucura, não tinha orçamento nenhum àquela hora, vivendo aquela questão de ISL, retirada de dinheiro, é muito difícil planejar. Conversando com as áreas, montando orçamento de custos, despesas, receita...em determinado momento ele chegou para mim e falou: “Cláudio, estou com problema na área de marketing. Eu não confio nos demonstrativos financeiros que estão vindo de lá, de receitas e despesas, eu não tenho uma outra pessoa para colocar lá que seja da minha confiança, então queria que você fosse vice-presidente de marketing.” Eu falei: “Olha...eu nunca trabalhei com nada de marketing”. Ele falou: “Cláudio, se eu colocar uma pessoa honesta lá já vai ser um ganho pro Flamengo enorme. Além do mais, você é uma pessoa que faz negócios. E a área de marketing, uma boa parte dela, é uma questão de relações negociais.” Fui para lá, tinha uma equipe boa, jovem, boa equipe. Tenho muito respeito e admiro muito os meus funcionários da época. Tenho muito carinho por eles. Eram jovens, estavam sem liderança, e eu fiz o que faço em qualquer lugar, já que eu não era um cara de marketing eu administrei aquela área. Organizei, criei funções, determinei processos, chamei todos os stakeholders, todos os fornecedores, os licenciados, olhei aquilo tudo e renegociei tudo...era um ano, um ano e dois meses de mandato. Então, posso não ter criado produtos novos mas organizei a casa toda. E só isto gerou um superávit pro Flamengo muito grande, na área de marketing. Flamengo naquela época não tinha controle algum de licenciamento. Me lembro que a Nike era fornecedora de materiais esportivos. Pedi um relatório de vendas de um mês específico, que não me recordo, de quantidade de camisas...1.200...Eu falei:” Pera aí, que controle é este? Como assim 1200? 1200 camisas é o que deve vender um camelô na Uruguaiana!”
MRN: O Botafogo... (risos)
Pracownik: Ou um clube de menor expressão…” O Flamengo vender 1200? Isto não existe!” Era uma falta de controle absurdo. Aí fomos conversar com a Nike e tinha questões contratuais. Não é que vendiam 1200...é que tinha uma parte que fazia parte de nossa cota e outra que não. Não havia controle neste sentido. Era uma questão de controle administrativo nosso e intercambio adequado de informações. E acertar um relatório gerencial com a Nike correto. Reorganizamos. Então acabei ficando com a área de Planejamento e a área de Marketing. E assim acho que servi bem ao Flamengo.
MRN: Falando da Chapa Azul agora. Quem lhe chamou para compor o grupo e porque você aceitou?
Pracownik: Na verdade quem me chamou oficialmente para compor o grupo foi o Bap. Dentro do grupo ele já tinha conversado com algumas pessoas. Eu participei do Fla21. Fui do grupo fundador do Fla21 naquela época. Até achavam que eu seria candidato, sairam até matérias sobre isto na época. E o encerramento da Fla21 foi um encerramento meio conturbado. Uma decisão de apoiar outro candidato e algumas pessoas se sentiram desatendidas. Talvez uma falha de comunicação qualquer. E houve um racha ali dentro. O que aconteceu? À partir do Fla21, o Bap, estas pessoas, foram montar o seu próprio grupo de sustentação. Eu não fui para este grupo, efetivamente. Eu apoiei o candidato e continuei apoiando o Flamengo sempre que pude. Indo nos Conselhos e tal. E participando efetivamente dentro dos grupos que estavam lá. Eu não tenho uma tendência política, eu apoio o que for bem pro Flamengo. Em determinadas votações, me lembro bem, na época do Edmundo, se tinha uma votação que achava que era uma boa pro Flamengo, eu apoiava. E vinha pessoas dizer para mim: “Cláudio, você é muito bom, pena que apoia as pessoas erradas.” Eu respondi: “Eu não apoio pessoas erradas, eu apoio ideias. A ideia da votação de hoje é correta para o Flamengo. Eu vou apoiar. Eu não sou contra o Edmundo. Eu sou contra ou a favor de projetos.”. Então quando o Bap conversou comigo, já conhecia algumas pessoas que ele estava chamando para montar a chapa. Tostes já estava conversando com ele, que foi um cara que estava comigo no Fla21, virou um amigo meu, grande amigo meu. O Póvoa virou um grande amigo meu naquela época também.
MRN: Póvoa também era do Fla21?
Pracownik: Também estava envolvido nesta questão toda. Pessoas de bem que estavam ali com a gente.
MRN: Incrível que podia ter antecipado tudo isto naquela época…
Pracownik: Podia mesmo. O Póvoa sempre participou das questões políticas. A princípio a gente andou sempre junto. A gente sempre se ligava: “Vamos apoiar quem?” Então quando aconteceu isto, ele me chamou para conversar...eu estava apoiando o Ronaldo (Gomlevsky)! Eu não tinha sido chamado para apoiá-lo mas eu tinha ouvido falar da chapa, então estava apoiando o Ronaldo. Que era um amigo antigo meu. Conheço o Ronaldo desde os 13 anos de idade. E eles me chamaram, falaram que eram da Fla21, não sabiam como estava meu posicionamento. Expliquei para eles, sendo transparente sobre o assunto. Expuseram a plataforma, que era uma plataforma com a qual eu tinha total sintonia. E aí conversei com Ronaldo, que esta plataforma tinha nossos ideais e tal. Ele veio se juntar ao grupo depois. Mas eu saí antes e entrei para a famosa Chapa Azul. Fiz a campanha por ela.
MRN: E então vocês aprenderam com os erros da Fla21 para evitar repetição…
Pracownik: Exatamente. A gente aprendeu muita coisa. Continuamos aprendendo né? Mesmo assim a gente errou muito. Mas foi um trabalho muito bem feito na eleição. Era muito organizado. Nem conhecia estas pessoas todas que são meus amigos hoje em dia. A gente forma um bom grupo de amigos que sabem discordar com respeito quando for necessário.
MRN: O que vai acontecer sempre. Sempre haverá discordâncias.
Pracownik: Ainda bem né? O crescimento só vem na discordância. Se não houver discordância não haverá crescimento algum.
MRN: E nesta eleição em dezembro, no caso, vai continuar na Chapa? Se ela vencer vai fazer parte do Conselho Diretor no próximo triênio?
Pracownik: Olha...qualquer vice-presidente que esteja trabalhando neste momento com Eduardo não é oposição ao próprio Eduardo, não é? Nós não definimos ainda qual vai ser o papel de cada um ano que vem. Eu vou continuar colaborando. Qual cargo? Qual função? Nós vamos definir juntos. Como eu te falei...não existe uma predileção nossa por cargos...para gente isto é muito pouco importante. O importante é o Eduardo confirmar o nome dele para a reeleição, e eu vou estar apoiando! Depois que a gente ganhar a eleição, sendo Eduardo o candidato, nós vamos sentar e ver: Como é que cada um de nós pode ajudar?
MRN: E o Eduardo Bandeira hoje é seu candidato de preferência na próxima eleição?
Pracownik: Se ele confirmar...sem dúvida! É uma questão de coerência, não é? Se o Eduardo não fosse o meu candidato eu não poderia estar trabalhando com ele. Estou lá! Servindo ao Flamengo, fazendo parte da equipe e o Eduardo é o presidente. Então, ele tem todo o meu apoio.
MRN: E no seu ponto de vista, exercendo muito bem o papel de presidente...
Pracownik: Acho Eduardo um cara sensacional. Este momento que o Flamengo viveu e vive, a gente não poderia ter pensado em um nome melhor. O Eduardo, ao contrário da grande maioria de nós, Ele tem uma qualidade...tem outros defeitos como todo nós temos...mas ele tem uma qualidade que nenhum de nós tem, que é a ponderação. Eduardo é um cara, que ele consegue, diante dos maiores absurdos, que a vida do Flamengo impõe a cada um de nós, se manter impávido. Calmo.
MRN: Serenidade…
Pracownik: Ele é sereno! Ele ouve. Ele espera a hora de falar. Em dados momentos as situações são tão absurdas...que eu às vezes tenho que sair para não intervir de maneira um pouco mais violenta, agressiva do ponto de vista das minhas colocações. O Eduardo consegue...esperar se colocar. E a gente enfrentou tanta coisa...agora a gente está em um momento um pouco melhor dentro da política do clube. A gente viveu tantas situações injustas, tantas situações absurdas, que outros de nós estivéssemos lá e não o Eduardo, talvez as coisas saíssem do rumo. Poderíamos não ter sido o melhor pro Flamengo. Então o Eduardo...tem meu respeito, minha admiração, e meu carinho pessoal por ele.
MRN: E o Bap, o que aconteceu?
Pracownik: Bap saiu pelos motivos que ele apontou. Que cabe a ele apontar. Ele deixou bem claro os motivos pelos quais ele saiu. Não posso discordar dos motivos que são dele. Cada um tem seus motivos. Cada um de nós que casou com a mulher com quem é casado, ou foi namorar alguém, atendeu seus próprios objetivos, a visão interna, de cada um de nós. Percepção interna. Não posso julgar os motivos de cada um. Tem os motivos dele. Ele entendeu que eram o suficiente para ter este tipo de consequência e atendeu ao que ele pensava. Foi honesto consigo mesmo. Bap é um cara honesto. Então ele foi íntegro com o pensamento dele, achou que se violentaria se continuasse no grupo. Se o grupo perdeu com a saída dele? Lógico que perdeu. Um cara competente profissionalmente, foi um dos idealizadores deste grupo que ali estava, que contribuiu e contribui muito com o Flamengo. Mas o Flamengo é muito maior do que qualquer um de nós. Eu acho que foi uma perda ele ter saído como seria uma perda se qualquer um de nós saísse. Mas como ele mesmo fala: é um grupo, e um grupo é muito maior que uma pessoa! E ele mesmo prega a questão de se trabalhar em grupo, o grupo tá lá! A gente sobreviveu a saída de outras pessoas, o Godinho saiu. Também é um cara competente.
MRN: Também foi uma perda muito grande...
Pracownik: Uma perda muito grande. A gente conseguiu manter o grupo unido e vitorioso. Existe uma expressão psicanalítica chamada “perdas necessárias”, que se aplica ao fato de, principalmente na formação do indivíduo, quando ele é jovem, certas perdas serem importantes. Fortalecem convicções, te deixam mais precavido. Te deixam mais forte e preparado. Então, cada uma destas perdas, de certa forma nos tornou mais fortes. Por mais que a gente perca a companhia e a competência do Bap, nós ganhamos aprendendo com este episódio, e acho que vamos conseguir evitar, no futuro situações semelhantes. São “perdas necessárias”, são dores de crescimento. Todo mundo quer crescer sem dor, mas isto é impossível. E a gente tem que aceitar estes momentos e aprender com eles.
MRN: Mas você presenciou os episódios que ele alega em que o grupo tenha tomado uma decisão, aí o presidente ou qualquer outro vice-presidente, tenha tomado outra? Existiu este tipo de situação?
Pracownik: Eu presenciei algumas vezes isto...E não foi só com Eduardo. Vários Vice-Presidentes também o fizeram. Não me recordo, mas eu mesmo posso ter feito isto.
MRN: Você acha que isto é normal de acontecer? ...
Pracownik: Acho que é indesejado, mas é normal. Acontece. Em alguns momentos eu fiquei irritado. Presenciei isto com vários vice-presidentes. E o que posso dizer é o seguinte: Se vice-presidentes fizeram isto, em alguns momentos, por mais que possa ter ficado chateado, a gente entendeu e se reorganizou. De certa forma, quando um presidente faz isto, é ainda mais compreensível. Afinal, ele é o presidente. Se os vice-presidentes podem se permitir fazerem este tipo de coisa, quiçá o presidente! Não acho que nenhuma das vezes em que isto aconteceu tenha sido bom. Mas se aconteceu com vice-presidentes ainda mais com o presidente que, efetivamente, estatutariamente, é o responsável. Patrimonialmente, é o responsável. É a pessoa que tem mais exposição e, portanto, sofre mais por causa disso. As consequências são diretas nele e na família dele. E acho que, as vezes em que isto aconteceu, a grande maioria delas, e aí cada um tem a sua visão e o Bap tem todo direito de ter a visão dele....a maior parte das vezes em que isto aconteceu foi erro de comunicação, que acontece em qualquer lugar do mundo, em qualquer empresa. E, o mais importante, foram ações bem intencionadas. O que me faria ir embora deste grupo seria se eu percebesse algum erro deste tipo que tivesse sido mal intencionado. O mais importante para mim é o fundo, o conteúdo. Se há uma boa intenção, tudo pode ser perdoado, tudo pode ser reorganizado. E este grupo só tem boas intenções. Só tem pessoas de bem. E aí inclui todas as pessoas que estão ali dentro e as que já não estão mais: o presidente, o Bap, e demais vice-presidentes. São pessoas do bem. Isto me dá conforto. Me dá ânimo. Houve momentos em que a vontade do grupo pode não ter sido respeitada mas me dá o conforto em saber que a pessoa tentou fazer o melhor, e portanto, a gente vai crescer mais forte e impedir que isto se repita.
MRN: Acha que há uma divisão no CODI entre o pessoal que é mais ligado ao Bap e o pessoal que não é tão ligado assim?
Pracownik: Não...eu acho que o Bap tem pessoas que são mais amigas dele, são amigas há mais tempo e isto não interfere no dia a dia. As pessoas que estão lá trabalhando, que estão vice-presidentes atualmente, são pessoas que trabalham juntas em nossas reuniões e não existe nenhum interesse distinto, nem representado ali uma divergência de interesses. Todos querem o bem do Flamengo, todos são pessoas do bem e todos trabalham juntos em um conselho diretor, cujo presidente é o Eduardo.
MRN: Porque há um receio generalizado de um racha na Diretoria
Pracownik: Não acredito em racha algum. Acredito que existe a possibilidade de ter um outro candidato, como o Bap mencionou. Não sei quem seria. Se por acaso este novo candidato a ser lançado, o nosso grupo que está lá atualmente na gestão, julgar, junto com Eduardo, que é um bom candidato, pode até apoiá-lo. Eu não consigo imaginar um racha na ausência de candidatos. Sequer o Eduardo confirmou. Embora a gente gostaria que ele seja reeleito. É meu candidato. Sequer ele confirmou. Sequer existe um outro candidato. Não existe racha algum.
MRN: É tudo especulação.
Pracownik: É, absoluta especulação. Como existe uma convergência de boas intenções, como existe um grupo de pessoas do bem, eu não consigo enxergar nenhum racha que possa ser danoso ao clube.
MRN: E se o Bap formasse um outro grupo de oposição, supondo que ele fosse às últimas consequências. Acha que em tese poderia ser até ser benéfico ao Flamengo, por ter mais um grupo pensando o bem pro clube, ou prejudicial, porque atrapalharia esta unidade que foi conseguida?
Pracownik: Olha, eu acho que...oposição é um item fundamental em uma instituição democrática. Tem que ter oposição. Mesmo que a gente tenha divergências, oposição fiscaliza, cobra, traz novas ideias. A oposição normalmente, dentro de um organismo democrático, se caracteriza por uma divergência de ideias. Então, havendo uma oposição com divergência de ideias, ela é construtiva. Se existir uma oposição, uma outra chapa, que pensa exatamente igual a nossa, não faz sentido algum. Não adiciona em nada a democracia. Se houver uma oposição que não traga uma contraposição de ideias, não acho que seja uma oposição válida para a consolidação democrática. Se houver uma oposição bem intencionada que traga ideias diferentes, uma visão distinta pro Flamengo, não só acho que ela é válida, como acho que seja necessária.
MRN: Agora vamos falar do futuro...você pretende um dia ser presidente do Flamengo? Está em seus planos? Tem esta ambição?
Pracownik: Eu não diria que tenha esta ambição...mas tenho este desejo sim. Não é o momento da minha vida. Seria a realização de um desejo daqueles mais verdadeiros, que é o desejo infantil. É o sonho de criança. Quando é criança você quer ser astronauta...então é um desejo importante, daqueles que te impulsiona na vida, é aquela força motriz que te impulsiona nas outras coisas na sua vida pessoal. Agora este meu desejo não é maior do que o desejo de ver o Flamengo bem. Em determinados momentos, fui convidado para ser presidente do Flamengo. Em todas elas, acho que até poderia ter sido eleito. Mas achei que não era o melhor pro Flamengo naquele momento dado a minha disponibilidade de tempo, dado as necessidades do clube naquele momento, dado minhas características pessoais. Então o meu desejo de ser presidente do Flamengo só não é maior do que ver o Flamengo bem. Eu não tenho esta vaidade de ser presidente. Tenho a vaidade de ver o Flamengo bem. Então, em algum momento em que eu achar que a oportunidade existe, e que é o melhor momento para eu me candidatar, e que isto é o melhor para o Flamengo, eu posso vir, efetivamente, a ser candidato.
MRN: Não acha também que por mais que o presidente tenha um grupo, ele não precisa de dedicar muito tempo ao Flamengo? E isto não torna inviável uma pessoa muito ocupada em seu trabalho, de exercer este cargo?
Pracownik: Concordo com você. Acho que ser vice-presidente do Flamengo, ser presidente de outros poderes, Conselho de Administração, mesmo Conselho Deliberativo, não exigem que a pessoa dedique 100% de seu tempo. Ser presidente do Conselho Diretor exige dedicação integral. Este é um cargo de dedicação integral. Este é um dos motivos, efetivamente, pelo qual eu não poderia ser candidato agora. E entendo que qualquer outro candidato deveria dispor desta consciência da necessidade de dedicação integral ao Flamengo. Não há outra hipótese que se exerça a presidência do Flamengo que não seja pensar nela 100% do seu tempo. Isto impõe, mesmo que você não queira fazer desta forma, que o Flamengo vai estar na sua vida 24 horas por dia. Então com os vice-presidentes e sei que com os presidentes de poderes também é complicado...eu vou em reuniões de trabalho, importantes, em que mais da metade dela se fala sobre o Flamengo. Eu digo: “Pessoal, vamos falar de negócios…”. Com gente importante! gente que dou meu cartão aqui do banco, do Brasil Plural, e a pessoa pergunta: “Mas você não tem uma do Flamengo?” Tenho certeza que a do Brasil Plural muitas delas não vão guardar, a do Flamengo vão guardar. Então, é um impacto em nossas vidas...Sou uma pessoa low profile, tento me manter absolutamente longe dos holofotes, sempre fui assim, inclusive em minha vida profissional. Já fui reconhecido pelo guardador de carro em um hotel em Miami. Já fui reconhecido aqui em Angra dos Reis, na Serra, em restaurante pelo maitre, ao entregar cartão para pagar uma conta. E isto é um vice-presidente de administração do clube que faz questão de não estar nos holofotes. Flamengo é uma força que se impõe na sua vida. O presidente tem que se deixar levar por esta força.
MRN: O que o torcedor e associado podem esperar do futuro mantendo este tipo de gestão de desenvolvimento sustentável que tem hoje?
Pracownik: O Flamengo progressivamente vai encontrar o seu destino. Nós montamos, viemos, eu aderi ao programa sabendo que era um projeto de longo prazo. Eu acredito que as coisas de curto prazo não são sustentáveis no tempo. Os objetivos não podem ser de curto prazo. Você tem ações de curto prazo, mas você tem objetivos de longo prazo. E é o que a gente vem fazendo. Ações de curto prazo sem perder o norte do nosso longo prazo. O que os associados e torcedores podem esperar é um clube, um time, cada vez melhor. Um crescimento com passos fundos, com raízes. Você pisa neste chão com passo forte. A gente não vai dar passos para trás. Mais fácil você dar passos mais lentos adiante, mas sempre adiante. Então o que as pessoas podem esperar é um Flamengo cada vez melhor. Cada vez mais forte. E um Flamengo que não perde seu norte. Que é um norte de clube cidadão. Que é um norte de um clube honesto, cumpridor de seus deveres, que traz credibilidade para todos seus stakeholders. Um clube que é transparente, um clube que se comunica, que é aberto. A gente vai melhorar. Não só o clube vai estar cada vez melhor, não só o time vai estar cada vez melhor, mas nossa gestão vai estar cada vez melhor, E acho que a gente vai aprendendo. A gente vai sempre errar. Mas acho que a gente vai cada vez errar menos. E o que as pessoas podem esperar é que isto aconteça, e aconteça de forma transparente.
MRN: O Flamengo formou uma equipe maravilhosa nos anos 80. Muitos acharam que este momento duraria para sempre. Mas não durou. O time ganhou o título brasileiro de 92 depois só voltou a ganhar em 2009. Esta gestão Chapa Azul, para mim, lembra um pouco isto. Um grupo de gestores conseguindo ótimos resultados. Como não perder este momento? Como tornar isto perene no Flamengo?
Pracownik: Acho que tem dois fatores importantes a se destacar nisso. Primeiro a nossa obrigação de fazer sucessores. A gente vem se preocupando com isto. Cada vez mais a gente tem buscado pessoas mais jovens para fazer parte da administração. Tem dois jovens no Conselho Diretor, o Rafael Strauch e o Pedro Iootty. São jovens e competentes. E a gente tem obrigação de trazer mais jovens para este Conselho. Talvez a gente traga ainda este ano, mas com certeza vamos trazer ano que vem. Esta é uma preocupação que nós temos nas nossas empresas. Em todas empresas que fui trabalhar, eu reuni os funcionários, no meu primeiro dia de gestão e disse: “Hoje é o início do meu fim.” Só vou ter sucesso se me tornar dispensável. A pessoa que é indispensável é um fracassado, porque tornou toda uma estrutura dependente dele. O competente é aquele que cria processos. Que te dá a liberdade de se buscar novos projetos. A sua competência e a sua dispensabilidade é que vão te dar liberdade para você se realizar na vida. Então nós temos obrigação de criar sucessores nas nossas empresas e da mesma forma a gente tem esta obrigação dentro do Flamengo. A gente não perde este objetivo de vista. O Flamengo recentemente fez uma leva nova de conselheiros. Acho que foi o Gilberto Cardoso Filho que fez um discurso no dia da votação para que se aceitasse a entrada destes novos conselheiros e ele falou: “Flamengo tem que se renovar. Estou cansado de ouvir as mesmas pessoas, estou cansado de me ouvir”. Talvez foi o passo mais importante, momento mais decisivo, pro futuro do Flamengo, uma das maiores alegrias destes anos que a gente está no Flamengo foi esta sessão. Que foi a entrada destes novos conselheiros. As sessões agora estão cheias de pessoas inteligentes, que não necessariamente concordam umas com as outras mas querem o bem do Flamengo. Que discutem. Então, isto é a garantia que a gente tem. São as pessoas que entraram para o Conselho agora. Lá estão os futuros vice-presidentes e presidentes do Flamengo. Uma outra coisa é a própria seleção natural, a aprovação da Lei de responsabilidade fiscal rubro-negra, por si só, vai evitar que aventureiros se candidatem a cargos dentro do Flamengo. Com isto a gente já faz uma boa filtragem e traz no mínimo pessoas bem intencionadas. E isto já é muito bom. Então, o futuro é muito promissor neste sentido. Se a gente tinha esta preocupação, a preocupação hoje é muito menor.
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