Potencial construtivo, obras viárias, licenças, batalha judicial: Eduardo Paes abre o jogo sobre 'maratona' até estádio do Flamengo
O prefeito Eduardo Paes conversou na manhã desta terça (13) com um grupo de sócios da oposição do Flamengo, liderados pelo ex-presidente e deputado federal Eduardo Bandeira de Mello e o candidato a presidente Maurício Gomes de Mattos.
O MRN teve acesso ao áudio da reunião realizada num hotel de Copacabana, na qual Paes falou sobre o projeto da construção do estádio do Flamengo no Gasômetro e respondeu dúvidas dos sócios do Flamengo por mais de uma hora.
Na gravação de mais de 50 minutos, Paes fala com detalhes sobre o que ele chamou de “maratona” até a conclusão do estádio do Flamengo, que tem prazo previsto no edital do leilão de quatro anos e meio e previsão de inauguração da diretoria do Flamengo para novembro de 2029.
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Parte dessa maratona será a batalha judicial com a Caixa, que passa por uma guerra de narrativa. O prefeito constesta que o banco esteja perdendo dinheiro com a operação. E mais: anunciou que, se alguém cometeu irregularidades no processo de venda do terreno ao Flamengo, foi a própria Caixa.
“Eles, literalmente, por isso que eu falei já, se alguém quiser vazar isso pode vazar, não é à toa que eu estou falando o que eu estou falando aqui. Mas na verdade eles é que estavam cometendo uma fraude. Transformando um número artificial do metro quadrado ali para tentar supervalorizar e inviabilizar essa compra do terreno pelo Flamengo”, afirmou.
O prefeito anunciou que o Flamengo deve assinar com a prefeitura a promessa de compra e venda nesta sexta-feira (16). O último passo para isso foi dado nesta terça à noite com a aprovação, pelo Conselho Deliberativo do clube, do seguro-fiança que garante o pagamento de R$ 41,5 milhões extras caso a Justiça aumente o valor do terreno.
Além do vídeo com a transcrição completa, o MRN destaca abaixo os principais tópicos da fala de Paes:
Papel do Flamengo na revitalização do Porto Maravilha
“O que foi, ao longo desses anos, a construção do Porto Maravilha? A gente pegou uma coisa do nada, a região mais degradada da cidade, e nós precisávamos animar aquela festa. Mas, na verdade, foi um grande processo de construção de narrativa.
Não pode fazer mais nada, mas eu estou vendendo ar para você comprar o ar de mim, ou seja, o potencial construtivo. E isso vai financiar um monte de obra nessa região no futuro.
E a gente está entregando, isso é o mais legal da história. Mas o Porto Maravilha sempre teve essa coisa do simbolismo de alguns equipamentos icônicos. O Museu do Amanhã é isso, o Museu de Arte do Rio é isso, o Aquário é isso, mais recentemente, o IMPA, o curso de graduação do IMPA é isso.
Quando aquele Acqua, aquele prédio, é um projeto do Norman Foster, um super arquiteto inglês, que eu condicionei a quem fez aquele prédio, vai ter que trazer um grande nome internacional. Ou seja, para estimular o desenvolvimento daquela região.
A recuperação agora da estação da Leopoldina. Então, o quê que ao longo de debates, conversas, e aí eu confesso que é mais com alguns atores do urbanismo do que com o próprio interesse do Flamengo, o próprio presidente Landim, eu entendia que ter ali um estádio, a partir de certas qualidades urbanísticas, ambientais e de mobilidade, ia ser um fator de mais atração, de novo, para que aquela região se desenvolvesse?
Por que é tão importante? Porque ali a gente expandiu a operação urbana, que era até Francisco Bicalho, hoje ela vai para São Cristóvão todo. O que é uma coisa muito interessante. Só para vocês entenderem a lógica de fundo aqui é o seguinte: eu não quero que o tamanho da cidade aumente.
Cidade que cresce demais no seu território, ela é mais cara. É mais polícia, é mais investimento público, é mais gari, mais iluminação, mais tapa-buraco, mais asfalto, mais escola, mais tudo. A minha lógica é, segura o crescimento do Rio, paremos de crescer em direção ao oeste. Vamos crescer onde a cidade já tem infraestrutura.
Então, a lógica urbanística passou a fazer sentido. Ou seja, o estádio do Flamengo ali, com toda a força que o Flamengo tem, com todo o imaginário que o Flamengo tem, com todo o valor intangível que o Flamengo representa para o Rio de Janeiro, e cá entre nós, essa instituição precisa ter uma casa própria, tem que ter isso.”
Desapropriação e batalha judicial
Se você ficar sentado em cima de um patrimônio seu e não fizer nada, o IPTU vai crescendo numa proporção que daqui a pouco você não consegue pagar. Produza, torne a propriedade urbana produtiva, o IPTU é um instrumento urbanístico.
E esse instrumento que nós nos utilizamos, a desapropriação por si só é um instrumento muito forte, mas é uma questão interessante porque qual seria o movimento se não tivesse esse instrumento? Eu teria que desapropriar, pegar o dinheiro que é da saúde, que é da educação, que a prefeitura tem que gastar e pagar a Caixa para depois vender para o Flamengo, numa operação com todos os riscos possíveis e imagináveis.
Então, dado o fato de que tinha ali o interessado, manifestadamente, publicamente manifestado o desejo desse interessado, no caso o Clube de Regatas do Flamengo, a gente colocou aquilo no ar. A Caixa tem vindo, depois de fazer tanta média, agora eles estão botando as manguinhas de fora. Tem me descido um cacete em várias ações, dizendo que eu fraudei, que eu cometi fraude à licitação.
Para vocês terem uma ideia, só falta eu terminar preso por causa do Flamengo. Aí é sacanagem completa. Já pensou o desespero? ‘Tá preso! Por quê? ‘Ajudou o Flamengo’. Porra não dá, melhor logo o fuzilamento.
Quando você tem uma manifestação de um ator privado, no caso o Flamengo, e diz, olha, eu tenho o desejo de fazer algo ali, e esses caras estão sentados em cima desse patrimônio especulando, é um instrumento que o município tem.
Eu faço uma desapropriação, faço ali um leilão depois, como a gente fez. Definimos o valor, e esse valor, o Clube tem que depositar o Flamengo assim, com a promessa de compra e venda, acho que sexta-feira. Agora, ainda promessa de compra e venda.
Já começou o negócio de avaliação, depois tem imissão de posse. Então, se nós fizermos absolutamente tudo, dentro das regras, dentro da lei, tanto que a Caixa Econômica Federal, depois entrou a AGU também, começaram a entrar no pedido de liminar, enfim, surgiram uns laranjas doidos aí também.”
Aumento do valor do terreno
“Então, o risco que tem, muito objetivamente, é você ter uma perícia judicial. Essa perícia judicial faz uma avaliação. O risco que tem é, independente do perito, avaliar por um preço maior do que o preço avaliado pela Prefeitura. Mas até isso eu acho que me parece um risco controlado.
Porque, se não falta, eu espero que a Caixa Econômica não tente mentir, porque esse prefeito aqui não é bobo nem nada. E a gente tem vários contratos de compra e venda do fundo imobiliário pelo valor. Por exemplo, eu peguei no meio dessa jornada aí, um belo dia, a Caixa negociava os terrenos e a CEPAC para o privado, para tentar vender para fazer prédios.
E aí, o preço do CEPAC do imóvel era muito equilibrado. O metro quadrado dos terrenos lá era muito equilibrado. Daqui a pouco, quando começa a história do Flamengo, a Caixa joga o preço do metro quadrado para a Lua, e baixa o preço do CEPAC.”
Tentativa de fraude da Caixa
“Eles, literalmente, por isso que eu falei já, se alguém quiser vazar isso pode vazar, não é à toa que eu estou falando o que eu estou falando aqui. Mas na verdade o que eles estavam fazendo é o seguinte: eles é que estavam cometendo uma fraude. Eles estavam transformando um número artificial do metro quadrado ali para tentar supervalorizar e inviabilizar essa compra do terreno pelo Flamengo.
Eu fui muito educado e gentil, que é meu estilo, não gosto nunca de brigar. Liguei pro presidente da Caixa numa sexta-feira à noite e falei, olha, não vá nessa direção, quero lembrar que essa é uma operação urbana consorciada, controlada pela CVM para um presidente de uma instituição financeira, e os seus diretores têm uma denúncia dessa à CVM pode representar problema. Vocês estão fraudando aí os números.
Então tem uma guerra. Eu estou falando isso aqui com muita ênfase para o Bandeira, porque o nosso deputado federal aqui tem uma boa entrada também no governo federal, inclusive eu já comecei uma vez com o presidente Lula sobre isso aqui. Então eu acho que é uma coisa que a gente tem que estar atento.
Mas se jogar dentro das quatro linhas, se jogar pela regra do jogo, pode haver sim um aumento do valor, o que aliás não parece ser um problema para o Flamengo. E aí eu vou voltar para aquele início que eu falei lá. Então pode haver um aumento do valor. Claro, vai caber ao Flamengo decidir se o valor que a Justiça avaliar é um valor factível para fazer essa operação.”
Potencial construtivo da Gávea e de São Januário
“Sancionei, recentemente, lá em São Januário, a lei que permitia esse modelo, que, na verdade, viabiliza os recursos necessários para a construção de São Januário. A gente fez, e aí eu estou querendo avançar já nessa explicação sobre o Vasco, porque ela, num futuro próximo, o Flamengo vai viver uma situação muito parecida.
O que a gente fez na proposta legislativa, que acabou sendo aprovada e virando lei, foi amarrando muito os recursos oriundos dessa operação urbana, ou seja, venda de potencial construtivo, à construção do estádio.
O meu temor é sempre o mesmo temor de que acompanha minimamente a política de clubes no Brasil. Um dia tem uma figura muito séria como o Bandeira no Flamengo, amanhã pode não ter uma figura tão séria assim. O Vasco é a mesma coisa, o Fluminense é a mesma coisa, a gente já viu isso acontecendo.
Então está muito amarrado esse ganho econômico que o Vasco tem com a operação urbana, ele está muito amarrado na lei, não é nem na regulamentação, por decreto do prefeito, não, é na legislação, está muito amarrado, acompanhamento, liberação de recursos, como é que faz fiscalização por parte do município.
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Fazer com que as pessoas entendam o impacto econômico disso para a cidade é muito difícil. Então nós não estamos aportando recursos públicos do tributo, do imposto que as pessoas pagam, mas de certa maneira esse é um ativo que pertenceria ao município, à municipalidade e não necessariamente ao Vasco naquele momento. De novo, isso será aplicado certamente para o Flamengo no futuro. E o Fluminense também está tendo essa discussão com a gente.
Um estádio das dimensões do Flamengo não é barato, custa dinheiro para fazer. Então eu já disse ao presidente Landim, tenho dito isso publicamente, que eu faria pelo Flamengo, não estou aportando, não aportei um tostão até agora aqui.
Então, assim, o que a gente vai ter que fazer? E eu acho muito difícil isso acontecer esse ano. Até porque eu me recuso a fazer isso de maneira assoberbada. Por que eu me recuso a fazer de maneira assoberbada? A gente pode construir as bases. Mas tem que passar pela Câmara.
E a ideia é, para ajudar na construção do estádio do Flamengo, a gente também dar o potencial construtivo da Gávea para o Flamengo. Isso pode significar uma entrada de não sei quantos milhões para o Flamengo. Aí sim vai ser uma atuação mais direta da Prefeitura, usando o patrimônio do município.
E é uma discussão que a gente está só começando. Só começando. E vai ter Câmara de Vereadores, vai passar pela Câmara Comunitária lá da Barra da Tijuca, com o Dr. Delair de novo, fazendo aquela reunião com um bando de síndico, reclamando da vida.
Enfim, tudo isso são discussões que a gente vai ter que encaminhar ao longo do tempo. Eu vou ter que entender que modelagem econômica é essa que o Flamengo está desenvolvendo. Quanto é que vale o estádio? Quanto é que vale os naming rights? Quanto é que vale… Isso vai ter que ser comprovado.
Eu estou lidando com dinheiro público. Aí eu não posso chegar e aliviar uma grana para o Flamengo, como eu não aliviei para o Vasco, por mais que tivesse me dado vontade. Paga todas as dívidas do Vasco, manda esses 7.1, 7.7, sei lá, embora e vambora.
Então, a gente vai ter que entender o modelo econômico do Flamengo, consolidado a questão do terreno, que eu estou muito otimista, consolidado a questão do terreno, que modelo econômico é esse que o Flamengo vai desenvolver ao seu estádio.”
Licenças
“Para que o estádio do Flamengo, que pode ser algo naquela região, com muita qualidade, com muita dignidade, com muita reflexão urbanística, com projeto bem elaborado, que pode significar um avanço enorme.
Eu já estou concebendo, em breve eu pretendo apresentar isso. Uma coisa é ligando o outro lado da linha do trem, do metrô, a Cidade Nova, onde está ali a prefeitura, com a Leopoldina. Fazendo os acessos em direção ao estádio do Flamengo a partir dos modais de transporte de alta capacidade.
Estamos começando a desenvolver o modelo de mobilidade de automóvel para evitar que se use a Francisco Bicalho. Tanto que no próprio edital do Leilão, a gente colocou isso. Vai ter que ter muita reflexão urbanística para se licenciar nesse projeto.
Se chegar ali e achar que vai meter um Urubuzão, sei lá como é o nome que vocês vão dar. Eu gosto do Santiago Mulambeu, mas tudo bem. Vai meter ali o Ninho do Urubu, um negócio preto e vermelho, um caixote horroroso, eu vou ser muito contra.
Vai ter de se ter uma reflexão sobre o impacto urbanístico, sobre a estética do estádio. Ele não pode ser um estádio de fachada fechada. Ele tem que ser o que a gente chama de fachada aberta.
O estádio funciona o quê? No máximo três vezes por semana, para jogos. Então não dá para ser um negócio que fica o resto do tempo totalmente fechado para a rua. Um paredão degradando a vida urbana.
Ele tem que ter vida ali, tem que ter conexão com a rua, tem que ter loja, tem que ter alguma coisa, restaurante, bar, para a gente criar a vida ali. Então tem uma série de desafios urbanísticos. Eu acho que a coisa está bem encaminhada, mas temos ainda, não é um tiro de 100 metros.
Temos uma maratona, estou doidão para ser prefeito dessa maratona, não vou participar da inauguração, porque eu não quero ficar feliz com isso, mas se Deus quiser, em breve o Flamengo vai poder ter sua casa, sim. E aí, da minha parte, é um pouco isso. Eu estou na minha quarta eleição para prefeito.
Todas essas eleições, eu, graças a Deus, ganhei três eleições para prefeito do Rio de Janeiro, sacaneando o flamenguista. Quando as pessoas tentam diminuir a ação que a gente está fazendo a uma jogada eleitoral, sinceramente eu desprezo, porque eu nunca fiz jogada eleitoral com o Flamengo
Mas tirando a brincadeira é isso, eu não estou aqui, eu disputei já eleições nessa cidade, venci, e acho, e obviamente tem sempre louco para tudo, mas acho que há bastante racionalidade mesmo nos mais apaixonados para a decisão do voto. É claro, é um gesto simpático ajudar o Flamengo, ter torcedor pelo Brasil inteiro e tal, é óbvio que as coisas têm suas razões de ser, mas eu acho que a gente está fazendo uma coisa com muito equilíbrio, que não é exclusividade do Flamengo, portanto eu não estou aqui para fazer média, acho que a minha obrigação é fazer média com as instituições da cidade, mas não estou aqui para isso, eu acho que é importante que essa instituição chamada Flamengo permaneça forte.
Eu não consigo tratar as instituições Flamengo, Vasco da Gama, Fluminense, Botafogo, como se atores privados fossem. Pela hora que eu sentava com o Carlos Carvalho para negociar uma coisa do Olimpíada, eu jogava com o privado que quer ter lucro legítimo. Ninguém que tem nada contra lucro.
Mas era assim a conversa. O Flamengo, ele tem outra dimensão. Ele é uma instituição pública. Não estatal. Mas é uma instituição pública. O Flamengo pertence, a dimensão é muito maior do que só os seus sócios.
Você falou que tem não-sócios aqui, não-sócios que se acham também donos daquela instituição pública. E é assim que é bom. A gente vai estar muito aberto nessa negociação, Maurício.
Muito aberto para viabilizar. É bom para aquela região o estádio do Flamengo, desde que bem feito, desde que feito de acordo com as regras. É bom para o Rio de Janeiro que o Flamengo saia forte da história. É bom para a cidade, para o Brasil, que o Flamengo tenha uma projeção mundial.
O Delair me conhece há 30 anos, 32 anos. Conhece o início da minha carreira política como subprefeito. Eu sempre arrumei muita confusão pela maneira direta de ser. E aí tem uma coisa de certas cenas de hipocrisia e enrolação que eu não estou a fim de assistir. Eu estava vendo um jogo de enrolação com o Flamengo, eu falei, eu não vou ficar nessa história. Ou me tira dessa ou eu vou entrar para fazer direito.
O Flamengo vai ter seu estádio, porque eu entrei agora e a gente bota as coisas em pé, pode ficar tranquilo.”