E se essa geração de jogadores do Flamengo perdeu a passada?
Por Tiago Cordeiro
Como admirador de futebol e não só do Flamengo, jamais vi um time sul-americano como a equipe mágica de Jorge Jesus há muito, muito tempo. É possível que nunca tenha visto. Em 2019, o Mais Querido dava a todos aquela sensação mística que poucas equipes em esportes dão: vai ser de quanto?
Até por isso, as quatro derrotas (número inacreditável) do treinador português à frente do clube merecem atenção, mas é papo para outro texto. Porém, o que vai ficar para a história e comentários esportivos são os títulos: um Brasileiro, uma Libertadores, uma Supercopa e uma Recopa.
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A era Jesus acaba com a saída do técnico, mas essa geração de jogadores foi um pouco além com Rogério Ceni e garantiu um Brasileiro e uma Supercopa da temporada 2020, que só acabou no ano passado.
Então 2021 pintava como um ano promissor em que o Flamengo teria tempo de se preparar e tentar ficar mais perto de 2019. Muita gente boa já analisou as razões do fracasso no Brasileiro, Copa do Brasil e (como dói) a Libertadores, mas eu vejo outra preocupação no horizonte.
Em 2012, pela última vez um time brasileiro conseguiu conquistar o Mundial em cima de um time europeu. Embora seja do grupo que acha que a Libertadores é o que importa, não sou unanimidade.
De lá para cá, o Corinthians conquistou dois Brasileiros, uma Libertadores e um Mundial. O Palmeiras colecionou duas Libertadores, dois Brasileiros e três Copas do Brasil, e devolveu uma derrota para a Supercopa com o gol de Deyverson.
O futebol e o tempo são um casamento cruel
O Flamengo de Gabigol & cia. fez cada rubro-negro acreditar que veria pela primeira vez em décadas uma nova era Zico.
Ou seja, um rubro-negro dominante e que coleciona a maioria dos títulos que aparecem como o Grêmio do início dos anos 90, o Vasco do fim dos anos 90 (cuja era mais vitoriosa acabou ofuscada por três vices contra vocês sabem quem), o São Paulo dos anos 2000 e o Corinthians da década passada.
Ao invés disso, com uma Libertadores e dois títulos Brasileiros o Flamengo aparece como o Grêmio dos anos 80: um time que incomodou muito e brigou com o maior bicho papão da época, mas esteve abaixo. Na época, o tricolor gaúcho conquistou uma Libertadores e um Brasileiro, além de uma Copa do Brasil.
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Não é vergonha não ser o grande bicho-papão da década. Mas o que incomoda é a sensação de que o Flamengo abriu mão de títulos por arrogância, a velha empáfia rubro-negra que só fica bem entre torcedores, nunca entre jogadores ou dirigentes.
É difícil demais formar um elenco com grandes jogadores que gostem de atuar juntos e que não tenham problemas entre si. Isso o departamento de futebol conseguiu. Como foi possível uma equipe com dois reis da américa, dois titulares das últimas convocações de Tite e uma equipe individualmente melhor ter perdido os dois títulos mais importantes da última temporada?
Uma equipe que abriu mão do Brasileiro de uma forma inaceitável e perdeu outro em uma falha individual com tempo para responder.
Nos próximos anos, o Palmeiras deve se manter como principal rival rubro-negro e pode ganhar uma força extra com a venda de Endrick e demais jogadores da base. Com isto, o Flamengo terá pela frente um adversário com mais poder financeiro e talvez com um elenco melhor. É um cenário que não existia entre 2019 e 2021 quando o clube falhou em superar o Palmeiras na Libertadores.
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Não se esqueça que Diego Alves, Rodrigo Caio, Filipe Luis, Everton Ribeiro e Bruno Henrique envelhecem a cada temporada e seus substitutos podem não alcançar o mesmo patamar por razões diversas.
Esse é o risco que o elenco e Departamento de Futebol rubro-negro assumiram: o de talvez ter desperdiçado o maior momento do clube em décadas e entrar para a história como uma geração que ficou atrás de Palmeiras e Corinthians na galeria de títulos.
Perder é do jogo e torcer para o Flamengo tem muito mais beleza do que apenas taças. Mas o Mais Querido precisa por na cabeça que o hino fala em “vencer, vencer, vencer” por um motivo. Se essa obsessão não está em cada polegada da Gávea, tem algo errado na República do Ninho.