Futebol é importante demais para ser levado a sério. Alguém precisa avisar isso aos especialistões dos programas esportivos, esses Einsteins da análise fria e ponderada do nobre esporte bretão que andavam tecendo teses sobre a fase de ouro do Botafogo, o “Aniquilador de Gigantes”, e lufando versos embevecidos de paixão pelo toque de bola irresistível do Grêmio do mago Renight. O que eu tenho a dizer para eles depois de quarta-feira é bem simples:
Cadê você? Cadê você?
Passado o primeiro jogo onde o Botafogo se recusou a jogar, mesmo em casa e com sua torcida sendo maioria, difícil acreditar que eles tentariam algo mais ousado em um Maracanã noventa e nove porcento coberto de vermelho e preto. Mesmo assim fiquei surpreso com o nanismo da postura do auto-proclamado Glorioso, digna de envergonhar a Cabofriense. O arqueiro dos feras fez cera desde o minuto um. Retardava qualquer reposição de bola, se contorcia o quanto podia num patético esforço para ganhar alguns segundos, quiça minutos, tentando ver se o cronômetro avançava e o jogo terminava empatado, ou, quem sabe, num contra-ataque de sorte eles achassem um gol.
Acontece que Don Rueda chegou chegando.
O Flamengo entrou em campo organizado como há muito não ficava. Era brilhante? Longe disso. Mas, esforçado, consciente e concentrado, não deixou o adversário se aproximar da nossa área. Colaborou, claro, o fato deles não tentarem muito. O menino goleiro Thiago era praticamente um representante da torcida em campo. Na verdade, acho que se fosse eu ali guardando a meta no lugar dele não teria feito diferença.
Havia ainda o juiz que, assim como o da partida de ida, também tentou de tudo para atrapalhar o andamento da partida. Inventava faltas bizarras, travava o jogo no apito tentando deixa-lo morno, truncado, injogável.
Mas nenhum dos antagonistas contava com o fogo nuclear que brota da Nação no Maior do Mundo.
Agora, pensando bem, percebo que é bem típico do Destino, esse brincalhão, em um momento em que a esperança de dias melhores desembarcou da Colômbia, ter escolhido Berrío como protagonista da epopeia.
Nosso muitas vezes atabalhoado velocista da ponta direita foi o encarregado de encarnar a Magia Rubro-Negra e, em um segundo de genialidade, deu um toque de letra magistral que imediatamente reinventou o drible da vaca, desenhando um épico instantâneo ao passar a bola para que o Lorde Diego a empurrasse com sua elegância característica para o fundo da rede.
Orlando Berrio. Que jogada! pic.twitter.com/TX3Gb0nlZf
— Seleção Brasileira (@BrazilStat) 24 de agosto de 2017
O gol no Maracanã lotado, amigos, é algo transcendental.
Uma catarse que ressignifica a vida e causa dependência imediata em quem experiencia a massa flamenga, como partículas em ebulição, se misturando em êxtase absoluto que resulta num advento de magnitude incalculável cientificamente que subitamente realinha a rotação do planeta e assim segue por toda a galáxia rumo ao infinito.
Que maravilha é ser um grão de sal nesse oceano vermelho e preto!
Estamos na final da Copa do Brasil.
E como a vida tende a ser justa mesmo que de forma bastante irônica, nosso adversário será o Cruzeiro. A equipe comandada por ninguém menos que Mano Menezes.
Sério, isso é tão fabuloso que nem um romancista habilidoso seria capaz de tramar uma decisão tão absolutamente espetacular!
Infelizmente o sorteio de mando de campo atrapalhou um pouco a cena épica da batalha final, mas isso é o de menos. Mesmo que a derradeira peleja seja travada nas Minas Gerais, tenho certeza que a vingança irrefreável que já entrou em curso será inevitavelmente consumada.
Está escrito. Quem viver verá.
Podem arrumar espaço na sala de troféus. O tetra virá.
Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramaturgo em peças, filmes, novelas e seriados. É autor do romance “Gigantes” (Editora Paralela/Companhia das Letras - 2015). Siga-o no Twitter: @pedroneschling
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Foto no post e nas redes sociais: Gilvan de Souza/Flamengo.
Pedro Henrique Neschling nasceu no Rio de Janeiro, em 1982, já com uma camisa do Flamengo pendurada na porta do quarto na maternidade. Desde que estreou profissionalmente em 2001, alterna-se com sucesso nas funções de ator, diretor, roteirista e dramat...