Com forte inflação, Mercado da Bola é armadilha que Fla tenta contornar

11/01/2024, 16:21
Léo Ortiz é um dos nomes que interessam ao Flamengo, porém clube tem dificuldade em fechar com o Bragantino pela forte alta dos valores; na foto, zagueiro aquece antes do confronto com o Athletico Paranaense pela Sul-Americana

Como precificar um atleta para vender ou para comprar? Este possivelmente é o principal questionamento que vive nas cabeças dos dirigentes brasileiros em tempos de janela.

Fatores como idade, posição, clube que detém direitos e a saúde financeira deste, tempo de contrato e históricos de base e de lesões são alguns dos principais indicadores utilizados para estimar valores “justos” de proposta a se fazer ou a se aceitar.

Abaixo veja ranking de atletas mais caros por posição, de acordo com o site Transfermarkt.

Mas a conversa pode ser aprofundada. Vamos falar do futebol enquanto cadeia de valor?

O produto do futebol é a bola rolando. Campeonatos, clubes e troféus são como a “embalagem” deste produto. Portanto, a qualidade da partida determina quanto aquele produto vale aos olhos do cliente. Exemplo disso é a nova geração de brasileiros que torce para clubes do exterior e consequente escalada da Premier League nos rankings de audiência televisiva pelo mundo.

Os insumos para este produto são muitos, mas rapidamente podemos pensar em insumos de baixo valor agregado, como bolas, chuteiras, redes para balizas e tinta. Estes insumos estão fora daqueles principais, que devem pautar o principal custo de produção daquele produto que falamos no parágrafo anterior.

Em especial, é óbvio, aqueles que fazem a magia acontecer. Os atletas!

Os principais insumos, portanto, são jogadores, comissões técnicas e estádios.

Os jogadores, além de serem os principais insumos deste produto, são também os de maior raridade, pois possuem alta diferenciação. Diferente de outros mercados que atuam com insumos animais, o futebol, por trabalhar com seres humanos, não permite uma reprodução perfeita destes insumos. Provavelmente por não ser legalizada a clonagem de seres humanos (que bom!).

“Pô, o cara tá falando de clonagem de seres humanos… melhor parar de ler isso!”.

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Calma, que posso explicar!

O fato de cada ser humano ser personalíssimo, gera o caráter único desta “matéria-prima”, que é o jogador de futebol. E para que o homem se torne jogador o período de formação é longo. Nos melhores casos sua estreia ocorre aos 16 anos!

Na contramão deste longo tempo de formação, está a duração deste “insumo”. Uma carreira de alto nível pode durar mais de 10 anos… Ainda assim, terá durado no mínimo 16 para se iniciar. 60% mais tempo investido na formação do que na utilização.

Mas onde eu estou querendo chegar com isso?

A reação do mercado a mudanças de contexto é obrigatoriamente lenta, uma vez que não há como acelerar o período de formação, ou colocar isso em escala superior a atual, entregando jogadores de mesmo nível de forma imediata.

Entrando mais dinheiro no mercado de transferências, o resultado imediato é de inflação!

Analisando as 10 principais ligas na janela de verão imediatamente anterior ao ingresso do dinheiro estatal da Arábia Saudita, podemos notar (figura 1) que o aporte de capital no mercado de transferências foi de 751 milhões de euros, tendo este aporte praticamente oriundo somente da Premier League.

Situação que mudou na primeira janela regada pelos sauditas (figura 2), pois, ao mesmo tempo que houve enorme aporte da família real da Arábia Saudita, este aporte não representou uma redução no valor aportado pelos ingleses, além do ingresso de uma 11ª liga, a do Catar, que contribuiu com os nada irrelevantes 163 milhões de euros no período.

Figura 1

Figura 2

Dinheiro novo somado à movimentação idêntica do mercado habitual, geram a óbvia constatação de que há muito mais dinheiro no mercado. Precisamente 50% mais dinheiro no mercado.

Tal inflação já pode ser observada neste início de janela brasileira, que já tem em Lucas Beraldo (ex- São Paulo) a maior venda da história entre zagueiros que atuam por aqui, após a concretização da venda ao PSG por 20 milhões de euros.

Imaginaram por quanto seria vendido o jovem zagueiro tricolor, caso o São Paulo vivesse a realidade financeira do Flamengo? Pois é. Mesmo o vendedor com o “pires na mão”, desesperado para vender, efetuou-se a maior venda da história.

A compra do bom (porém limitado com a bola), João Victor, por 6 milhões de euros pelo Vasco, também indica, assim como a venda do ótimo Murillo por valor muito superior ao de Robert Renan, vendido meses antes do aporte saudita.

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Vendas acima de 20 milhões de euros passaram a ser comuns. Antes praticamente só eram realizadas pelo Flamengo dentro do mercado nacional.

Dentro deste contexto, os dirigentes no país vivem sobre areia movediça, pois uma avaliação errada de seus ativos na hora da venda, podem deixá-los impotentes no momento da reposição.

Sendo assim, não se deve pessoalizar uma briga contra o Bragantino. Não creio que o Bragantino esteja realizando sobrepreço por saber que é o Flamengo que deseja contratar o melhor zagueiro do país que hoje está sob sua posse. O que o Bragantino tem, é medo. Medo de não conseguir repor tamanha qualidade em valores semelhantes ao vendido.

Da mesma forma, penso que a torcida do Flamengo não deva convergir as corretas críticas que merecem os dirigentes do Flamengo em pressão aos seus dirigentes para realizarem negócios de forma precipitada.

O momento é de cautela nas compras, mas também é de pavor nas vendas.

E quem vende naturalmente precificará este medo.