Por Zé Roberto Padilha
Foi bom não conhecê-lo de perto. Para ser verdadeiro, um ídolo tem que permanecer no nosso imaginário. Porque gente morre.
Ídolos permanecem por toda a vida. Quando ele veio jogar no Fluminense, em 1976, cruzamos o portão da Rua Álvaro Chaves e tive vergonha de me apresentar. Estava indo defender o Flamengo e ele chegava às Laranjeiras para ser bicampeão carioca com a máquina que ajudamos a montar. No duelo no Fla x Flu do troca-troca (1x1) só faltei pedir licença ao tentar alcançar a linha de fundo. De tão profundo era meu respeito de ponta esquerda. Nunca conheci nenhum ídolo de perto. Não me apresentaram ao Tarzan. Mandrake, Fantasma, só acompanhei seus feitos pelos gibis e Senna passava voando nas pistas. Quanto ao Drácula, me escondia debaixo da coberta para não vê-lo de perto. Tinha medo do meu ídolo sinistro que saia à noite para morder o pescoço das mocinhas.
Carlos Alberto Torres defendera minhas duas paixões esportivas: o Santos e o Fluminense. E uma década antes de Claudio Coutinho lançar o overlaping, surgira pela ponta direita apoiando nas costas do Jairzinho, durante a Copa de 70, para marcar o quarto gol brasileiro contra a Itália. Até então o futebol mundial só presenciara um precedente: em 1958, Nilton Santos surgira à frente do goleiro da Áustria, aproveitando o recuo do Zagalo, abrindo o caminho do Brasil rumo ao nosso primeiro título mundial. Até então os laterais só marcavam o ponta esquerda, poucos reuniam recursos e habilidades para se apresentar após o meio campo.
Classe, categoria, cabeça em pé, nosso eterno capitão jamais correu com a bola, era ela que lhe escolhia para receber um carinho. Erguia a cabeça e não cruzava, fazia lançamentos. De suas atuações, foram inspiradas as primeiras lições da cartilha do futebol para se atuar nas laterais: primeiro, marcar, e ele o fazia sem violência. Segundo, cobrir o zagueiro central, e em ultimo, apoiar o ataque. Poucos fizeram as três funções com tamanha competência. E poucos mereceram erguer aquele Caneco, em 1970, no México, para o orgulho de uma nação que reafirmava sua supremacia no futebol mundial. Para perpetuar sua imagem para todo o sempre na história do nosso futebol.
Domingo, após o clássico no Maracanã, as imagens da violência dos torcedores da Fiel nos fizeram permanecer assistindo a resenha do SporTV. E Carlos Alberto Torres estava presente. Não estava ali para se despedir, apenas foi avisar que a partir de agora vai assumir seu lugar de vez em nosso imaginário. Voará em nossos sonhos pela direita como Capitão Sul América, ressurgirá no Baú do Esporte pegando no sem pulo um passe do Rei Pelé a perpetuar a classe, a fidalguia e a nobreza como legado de um jogador de futebol único. Cidadão do bem. Um orgulho nacional. Descanse em paz, meu ídolo.
José Roberto Padilha jogou no Flamengo, Fluminense e Seleção Brasileira. Colabora periodicamente com o Mundorubronegro.com
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