A Libertadores será sempre mais difícil enquanto houver tanta desculpa
Nesta última segunda-feira (17/09), o diretor-executivo de Futebol do Flamengo, Rodrigo Caetano, foi o convidado do programa Boa Noite Fox, do canal de televisão por assinatura Fox Sports. Perguntado sobre o foco do time nas competições que ainda restam ao seu time, o dirigente respondeu falando sobre como a eliminação na Libertadores atrapalhou os planos para a temporada.
- O Flamengo este ano teve um episódio que estava completamente fora do nosso planejamento, que foi a eliminação da Libertadores. Não tivemos competência para somar pontos fora de casa. O entendimento dessa competição se dará com a equipe se fazendo presente em todas as edições, algo que na história do Flamengo não era muito comum. Disputava e depois ficava um tempo fora. A nossa ideia, de toda a diretoria, é que o Flamengo faça parte de todas as edições. Isso nos aproxima a conhecer os caminhos e poder, quem sabe, conquistar o segundo título da história - disse Caetano, que está no comando do departamento de futebol do clube desde o início da temporada 2015.
A fórmula parece óbvia. Afinal, um gigante milionário e organizado como o Flamengo, à medida que participa mais vezes, pode encaixar um bom time em uma boa campanha e levantar o caneco. A questão toda é que o Flamengo não precisa conhecer todos os tais caminhos e estar todo ano na Libertadores. Ele apenas precisa disputar a competição todo ano para ser campeão. A adoção de um discurso de clube cabaço não pode ser tornado oficial.
O Flamengo é campeão do mundo, Rodrigo Caetano. Em 2018, o clube entrou na Libertadores como favorito. Ninguém confere favoritismo a um time que não conhece os caminhos e que está sumidão da competição. O Flamengo de Guerrero e Diego foi temido. Os vexames dos anos anteriores têm suas razões específicas também. É constrangedor ver um dos responsáveis pela eliminação deste ano, transferindo a responsabilidade pelo fracasso a um fator abstrato - "conhecer caminhos" - e à uma falácia - "é preciso disputar todo ano". O Flamengo e a sua história não podem ser os culpados, isso soa como uma zombaria. O pior ainda é ver torcedor comprando este discurso canastrão do Flamengo, o Virjão das Américas.
O Corinthians, campeão em 2012, atualmente tem 13 de participações na Libertadores, mesmo número do Flamengo. Antes de erguer a taça pela primeira vez, em 2012, os paulistas participaram em 2010 e 2011 de forma seguida. Em 2010 foram eliminados nas oitavas de final justamente para o Flamengo, que naquele ano conseguiu estabelecer sua melhor participação desde 1993, caindo nas quartas de final para a La U. De 2006 até 2017 o clube paulista somou sete participações. No mesmo período o Flamengo participou de seis edições.
Gostaria muito que tivéssemos tradição na Libertadores. Quem me dera.
— DOUGLAS A OLIVEIRA (@doug_mengo) September 21, 2017
Outro recente campeão foi o Atlético Mineiro. O time de Belo Horizonte está longe de ser um clube com experiência em título grande. Até 2013, seu maior título ainda era a primeira edição do Campeonato Brasileiro, vencido no distante ano de 1971. História interessante a do time mineiro. Após passar 19 anos chorando a desclassificação de 1981, voltou ao torneio em 2000 e neste ano foi eliminado pelo Corinthians nas quartas de final. Só voltou a carimbar o passaporte de seus jogadores 13 anos depois, justamente o ano que foi campeão. Para o Atlético Mineiro não foi preciso participar sete vezes em dez para vencer um, como o Corinthians.
No Rio Grande do Sul encontramos outro exemplo de um clube que chegou “sem conhecer os caminhos”. Desde 1983, ano da apoteótica conquista do seu maior rival, o Internacional aturava todo tipo de pilhéria tricolor. Não tinha Libertadores. Não tinha Mundial. O Grêmio tinha os dois. Até que em 2006 um Internacional revigorado por milhares de sócios-torcedores, gestão moderna e organização fora e dentro de campo, consegue erguer o título da Libertadores e do Mundial. Apenas a sexta participação dos gaúchos na Libertadores. A última havia sido 13 anos antes, em 1993. Em 2007, a ressaca ainda era forte e o colorado bateu na fase de grupos. O Inter só veio a reencontrar a competição três anos depois. Resultado: Inter bicampeão em 2010.
O San Lorenzo é considerado um dos cinco más grandes da Argentina. E até três anos atrás o único deles a não ganhar a América. Uma desonra para o orgulho dos Cuervos. Em 2013 o clube ainda se recuperava do susto de quase ser rebaixado em 2012. Mesmo assim conseguiu classificar-se para a Libertadores do ano seguinte, após "intermináveis" cinco anos anos de ausência. Adivinhe qual time foi campeão?
Ocorreu de forma mais extrema o desce-sobe do futebol para o gigante River Plate. Rebaixado para a segunda divisão argentina, a única forma de diminuir a dor de sua imensa torcida era vencer. Primeiro a volta por cima doméstica: campeão da Primera Nacional B e o esperado retorno à elite argentina. Não era suficiente: o River venceu o Apertura e o Clausura 2012/2013, na volta para a primeira divisão do país. Ainda não bastava: venceram a Copa Sul-Americana em 2014. Para terminar de lavar a alma, campeão da Copa Libertadores da América 2015. A Libertadores não tem um padrão. O dinheiro e a estabilidade são bem-vindos, porém estão longe demais de serem preponderantes como em alguns campeonatos europeus. Não é incomum na Libertadores times que acabaram de sair do limbo ganharem o torneio.
O caso recente do pequeno Nacional do Paraguai, vice-campeão em 2014, lembra o do surpreendente São Caetano, segundo colocado em 2002, que perdeu o título nos pênaltis para o tradicionalíssimo Olimpia, do Paraguai. Poderia ficar aqui elencando dezenas de outros casos. Na edição atual, o Botafogo e o Barcelona de Guayaquil são exemplos. No ano passado o finalista foi o Independiente del Valle, clube que começou a jogar a Libertadores somente em 2014.
#Ficaadica: os dirigentes do Flamengo, amadores e bem-pagos, deveriam se lembrar da trajetória do Flamengo estreante na Libertadores em 1981. Foram 14 jogos, uma derrota, pedra, soco, pontapés, e muita superação. Uma história escrita com sangue, suor e talento. E nenhuma desculpa esfarrapada.
Diogo Almeida é editor-chefe do Mundorubronegro.com e também escreve no blog coletivo Cultura RN. Siga-o no Twitter: @DidaZico.
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